Para
a História da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários
Inconformado
com o sistema burocrático e funcionalizante (e mal pago para quem não
estava em exclusividade) dos Cuidados de Saúde Primários criei no início de
1998 a AMPF- Associação de Médicos de Família Independentes que representava os
Médicos de Família com atividade privada.
A APMF
enviou a proposta abaixo à então Ministra de Saúde Drª Maria de Belém com um
pedido de audiência.
A Direção
da APMF foi rapidamente recebida pela Dr.ª Maria de Belém que nos disse que
tinha recebido e lido a nossa proposta e estava de acordo com ela. E que era
mesmo para avançar rapidamente, ficando a sua Chefe de Gabinete encarregue de
fazer o assunto avançar.
Proposta : Médicos de Família
Independentes
em articulação com o S.N.S / A.R.S
Compete em
primeiro lugar ao Ministério da Saúde e às Administrações Regionais de Saúde a
Administração da Saúde Esta, não se
confunde, nem pode ser confundida ,com a Organização e Administração da
Prestação dos Cuidados de Saúde Públicos.
É legítima e
necessária para as populações a existência de uma alternativa Privada de
Médicos de Família, uma vez que a inexistência de modelos alternativos tem
conduzido à estagnação dos Cuidados de Saúde Primários e a alguma insatisfação
das populações sobretudo com a acessibilidade, assistência fora das horas de
consulta do seu Médico de Família, e com a assistência domiciliária.
É necessário
encontrar enquadramentos diversificados da prática da Clínica Geral-Medicina
Familiar que respondam a diferentes conceções de realização profissional,
social e económica, de forma a se resolver a atual crise de vocações.
Também no
sector privado a organização dos cuidados de Saúde deve assentar nos cuidados
de saúde primários, pelo que não é possível uma correta estruturação da oferta
privada de cuidados de saúde se não houver Médicos de Família Independentes.
O pagamento
do cidadão ao seu Médico de Família, desde que feito em regimes estáveis e
acessíveis que permitam a prestação de cuidados continuados, tem a vantagem de
aumentar a exigência e reforçar a ligação Médico de Família-Cidadão.
No atual
enquadramento não é possível a prestação de cuidados continuados e a
sobrevivência de Médicos de Família Independentes se estes não dispuserem dos
instrumentos necessários designadamente:
Articulação com
as várias instituições do S.N.S.
Comparticipação
no receituário.
Comparticipação
nos exames complementares e tratamentos.
Baixas.
Da mesma
forma que dispõem os Médicos de Família do S.N.S.
Sem estes
instrumentos torna-se impossível o exercício livre da especialidade Clínica
Geral-Medicina Familiar.
O direito à
comparticipação nos exames complementares, tratamentos e receituário, é um
direito do cidadão independente de quem foi o prestador que os prescreveu.
Existem hoje
meios de controlar de igual forma a atividade privada e a atividade pública.
A Lei de
Bases da Saúde, embora sendo demasiadamente restritiva, considera, na sua Base
XII, como fazendo parte do Sistema de Saúde os prestadores que estabeleçam
acordos com o S.N.S
Ao nível de
Cuidados de Saúde Primários é importante a articulação dos Médicos de Família
com as Administrações Regionais de Saúde e com a Direção Geral de Saúde para
que se consigam atingir os Obectivos de Saúde por elas fixados.
Propõe-se
assim:
1- Que os
especialistas de Clínica Geral-Medicina Familiar, e aqueles que por situação de
Direitos Adquiridos estejam aptos à prática desta especialidade, que o
entendam, possam fazer um acordo com a Administração Regional de Saúde em que:
a)- Se comprometem à prestação
de cuidados continuados aos cidadãos que se inscrevam na sua lista e a cumprir
as orientações de saúde estabelecidas pela A.R.S. e Direção Geral de Saúde com
vista ao cumprimento dos objetivos de saúde.
b)- Se estabeleça a sua
articulação com o Centro (ou Centros) de
Saúde da área em que atuem e os critérios de avaliação.
c) Que nesse acordo a estes
médicos seja facultado receituário e requisições do S.N.S. ou que o seu papel
timbrado possa funcionar como tal.
d) Seja facultado a estes médicos
a possibilidade de passarem baixas aos seus doentes em igualdade de
circunstâncias com os Médicos de Família dos Serviços Oficiais.
2- Que os
cidadãos que o desejem, possam voluntariamente desistir do Médico de Família
dos Serviços Oficiais e se inscrever na lista de um Médico de Família
Independente, que tenha estabelecido o acordo atrás referido.
3- Que o
Pagamento ao Médico de Família Independente deverá ser integralmente suportado
pelo Cidadão, sem prejuízo de eventuais benefícios fiscais ou existência de
terceiros pagadores. Caberá à Ordem dos Médicos o estabelecimento dos valores
máximos e mínimos quer se opte por um Regime de Avença ou por um Regime de
Pagamento por Ato.
4- Que no
cartão de utente do S.N.S. seja este o Médico nele referido.
5- Que
possam os cidadãos utilizar todos os outros serviços do Centro de Saúde tais
como cuidados de enfermagem, vacinação, assistência social, etc., sem prejuízo
da possibilidade de oferta, pelos Médicos de Família Independentes aos seus
inscritos, de serviços globais.
6- Que
mantenham os cidadãos os seus direitos de acesso a todos os outros serviços do
S.N.S. em igualdade de circunstâncias com os outros cidadãos do Centro de
Saúde.
7- Que seja
publicitada nos Centros de Saúde a existência de Médicos de Família
Independentes articulados com esse Centro de Saúde.
8- Que não
se exija de imediato aos Médicos de Família que pretendam seguir esta via nem
uma opção alternativa imediata, nem a
oferta Global de Cuidados de Saúde Primários, nem a sua organização segundo
modelos estereotipados, mas que se confie na iniciativa individual e no
mercado. Que se permitam desde já modelos mistos e experiências individuais que
permitam evoluir com a segurança e consistências necessárias para soluções mais
evoluídas. Que se considere já como ganhos importantes as melhorias na relação
Médico de Família- Cidadão e na acessibilidade.
No
seguimento entregámos uma elaborada proposta de acordo entre o Ministério da
Saúde e os médicos de família Independentes que permitia a um médico de família
(MF) privado requisitar exames complementares de diagnóstico comparticipados
pelo SNS (como já o eram as receitas de medicamentos – estas aliás na sequência
de uma proposta minha em nome de uma associação anterior, APMP – Associação Portuguesa
de Medicina Privada- que foi inicialmente recusada pelo Dr. Paulo Mendo que,
contudo, mais tarde a viria a implementar) os certificados de Incapacidade
Temporária para o Trabalho (baixas) aos utentes que optassem por ter um MF
privado em vez de um MF no sistema público, aliviando assim a pressão existente
da falta de médicos de família no SNS.
Contudo a
Chefe de Gabinete da Senhora Ministra transferiu-se para outro lugar e do
Ministério nunca mais vieram notícias pelo que, ao fim de um ano, encerrámos o
processo.
A meu ver
a elite dos Médicos de Família, próxima do governo e defensora de um SNS 100%
público não terá gostado da nossa proposta que iria pôr pressão comparativa ao
modelo público mas, em contrapartida, terá percebido a necessidade de abrir o
Sistema, embora sem perder a sua natureza pública. E assim apareceu em 1999 a
proposta experimental de unidades em regime remuneratório experimental que
concedia autonomia aos profissionais e uma remuneração ligada ao número
ponderado de utentes e ao desempenho em algumas áreas.
Confesso
que quando foi publicado o diploma corri a candidatar-me. Por quatro razões:
porque me permitia aumentar substancialmente a remuneração, o que era
importante para quem estava num regime de 35 horas simples, porque me garantia
a autonomia e gerir a minha relação com os meus utentes, porque me iria
permitir provar que os utentes podiam ser bem atendidos, sem esperas, e sem
filas de madrugada à porta da unidade e porque tinha a consciência de que só
haveria lugar para as primeiras candidaturas. E de facto só 19 se concretizaram
enquanto 100 já não conseguiram, tendo ficado os seus processos parados nas
gavetas das ARS, como nos diz Victor Ramos no documento MGF2030.
“Em
2005-2006, foi possível continuar o percurso iniciado aproveitando a mudança de
Governo e, novamente, o apoio do ministro António Correia de Campos. Foi
constituída a Missão para os Cuidados de Saúde Primários (MCSP), a qual foi
liderada pelo então Presidente da APMCG Luís Pisco. Foi dado um grande impulso
às unidades de saúde familiar (USF). Nessa
altura, encontraram-se paradas nas gavetas dos 18 serviços
sub-regionais das cinco ARS cerca de 100 candidaturas a
grupos RRE. A ativação destas candidaturas como USF permitiu
atingir um ponto de não retorno com entrada em atividade de mais de uma centena
destas unidades.”
E de
facto foi com os RREs que a revolução dos Cuidados de Saúde Primários começou, depois
de uma experiência sem grande sucesso, os projetos Alfa, que tinham a
componente de autonomia mas não tinham a componente remuneratória e por isso
tiveram uma adesão pequena.
E, como
diz Vítor Ramos, as 100 candidaturas a RRE existentes serviram de massa crítica
para o arranque da Reforma. Convém, contudo, notar que os Médicos atraídos para
a candidatura ao RRE foram aqueles que estavam em 35 horas simples (mal
remuneradas) que acumulavam com atividade privada de que resultou trazerem para
os RREs, e depois para as primeiras USFs, uma cultura de atividade privada em
autonomia e centrada na satisfação dos clientes rompendo assim
com uma cultura burocrática, centrada no sistema e não nos utilizadores.
Dia 1 de
Fevereiro de 2000 nasceu a Unidade de Saúde Familiar Rodrigues Miguéis- RRE que
com os outros 18 RREs começou a revolução nos CSPs.
Confesso
que sinto orgulho nos 10 anos que coordenei a USF Rodrigues Miguéis. Primeiro
pela mudança de paradigma que criámos, desde o primeiro dia, no atendimento
personalizado dos utentes, garantindo consultas programadas em 5 dias úteis (o
que durou durante os 10 anos em que fui coordenador) e todas as situações
agudas no próprio dia, por marcação telefónica. É da confiança que conquistámos
que resulta que nunca houve, nestes 20 anos, utentes à porta antes da Unidade
abrir para conseguir “uma vaga do dia”. Esta cultura, antes do mais assumida
pelo Secretariado Clínico, e devida aos profissionais e aos seus líderes, é,
ainda hoje, a imagem de marca da nossa Unidade.
Aliás
patente num inquérito de Satisfação realizado pela empresa de estudos de
mercado Nielsen por encomenda da ARSLVT, comparando as várias USFs de Modelo B
da ARSLVT e as sedes dos centros de saúde tradicionais, em que ficámos à
frente em todos os itens , exceto no das instalações que eram miseráveis, e na
sua grande maioria a nível da excelência com uma pontuação sempre de mais de
4,5 em 5 possíveis.
E segundo
porque foi da análise positiva do desempenho dos 19 RREs em comparação com
unidades tradicionais do mesmo centro de saúde que saiu a luz verde para a
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários.
Em
terceiro porque sendo o único RRE em Lisboa a nossa unidade serviu de montra ao
que era uma USF e tivemos a visita de todas as televisões e rádios, que, aliás,
nas suas reportagens só encontraram utentes satisfeitos.
Mas
voltemos ao início do século.
A APMF
enviou antes das eleições de 2002 uma carta aos dirigentes dos vários partidos
pedindo a possibilidade dos MFs Privados poderem passar exames complementares
pelos SNS e baixas da segurança social aos seus doentes. Teve uma única
resposta, do dr. Durão Barroso, aliás muito positiva. Contudo a sua saída
prematura do Governo não permitiu que aquela promessa se concretizasse,
restando a dúvida se o iria ser ou não.
Com as
candidaturas ao RRE bloqueadas (apesar de todas as juras em contrário) o
Sindicato Independente dos Médicos em conjunto com a Associação Portuguesa de
Clínica Geral (agora denominada Associação Portuguesa de Medicina Geral e
Familiar), para romperem com o asfixiante modelo burocrático, lançaram a ideia
de Cooperativas Médicas.
O que
aliás vinha ao encontro daquilo que eu sempre tinha defendido que eram unidades
dos profissionais convencionadas com o SNS e cuja proposta consta num livro que
publiquei em 2002 e que consubstancia as minhas propostas feitas no Grupo de
Estudos da Saúde do PSD (2000-2002).
No início
do seu mandato como Ministro da Saúde do Governo de Durão Barroso apresentei ao
Dr. Luís Filipe Pereira uma proposta estruturada de USFs privadas
convencionadas com o SNS (e que corresponderiam hoje às USFs de Modelo C
contempladas na Reforma dos CSP de Correia de Campos mas nunca implementadas
nem sequer regulamentadas) e com um modelo remuneratório muito semelhante ao
que viria a ser implementado no Modelo B das USFs. Admitiu a hipótese “será
possível começando com algumas e depois alastrando em mancha de óleo”.
Ficou de
pensar no assunto mas dias depois, precisamente num simpósio promovido pelo Sindicato
Independente dos Médicos sobre cooperativas médicas, onde estava toda a elite
pensante e representativa da MGF, apresentou o seu programa para a Reforma
dos Cuidados de Saúde Primários e, mal aconselhado, cometeu o “crime” de
em toda a sua intervenção não referir uma única vez as palavras “Medico de
Família” ou “Medicina Geral e Familiar”.
Usou sempre a expressão “Médico Assistente”,
que era uma expressão usada na altura no sistema privado pelas seguradoras e
referindo-se a Médicos Especialistas de Medicina Interna, ou indiferenciados, e
não a especialistas de Medicina Geral e Familiar (Médicos de Família).
Com isto
conquistou de imediato a hostilidade e desconfiança de todos os Médicos de
Família, parecendo dar razão aos que previam a solução dos utentes sem Médicos
de Família com o recurso a médicos não especialistas (chamados de
indiferenciados).
Seguiu-se
uma greve de 3 dias e uma edição de luto histórica do Jornal Médico de Família
que tinha na capa um poema meu.
Quando a
dor sufoca a alma
refugio-me
na poesia
e hoje é
dia
dia em
que foi decretado defunto o Médico de Família.
Eu,
Médico de Família, fui decretado defunto.
Ah! mas
eu, decretado defunto, vou lutar
porque
lutando, eu, ainda que miserável decretado defunto,
vivo
e uma
intervenção difícil, mas corajosa, do Ministro no Encontro Nacional da
APMCG , com a plateia (centenas de médicos de Família) voltada de costas, a
lançar as bases para um entendimento com os Sindicatos e AMPCG que veio dar
frutos como a avaliação dos RREs (que se veio a revelar muito positiva) e
um grupo de trabalho para preparar as bases do futuro.
Grupo de
Trabalho que seria retomado por Correia de Campos no Governo seguinte e que
depois se institucionalizou como Missão dos Cuidados de Saúde Primários que
tendo como Presidente o Dr. Luis Pisco, Presidente da APMCG, preparou a
Reforma. Acompanhei os seus trabalhos de perto porque um dos membros da minha
USF (o Professor Armando Brito de Sá) foi um dos “Missionários”.
Não posso
deixar de salientar o trabalho de bastidores para encontrar uma saída para
crise de 2002 desempenhado pelo assessor do Ministro da Saúde, Dr. António
Mocho. E a sua enorme capacidade de pôr as questões e irritações pessoais de
lado e se concentrar em ouvir e recolher propostas dos vários lados, entre as
quais as minhas, para se encontrar uma solução, apaziguando assim o conflito.
Assim
como o papel inestimável do Jornal O Médico de Família , órgão ligado à então
APMCG, dirigido por um jornalista profissional , Miguel Mauritti, quer naquela crise, quer sobretudo na
promoção da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários.
E assim
chegamos à Reforma dos Cuidados de Saúde Primários com a publicação do DL
298/2007 que continha a proposta da MCSP.
Esta
proposta assenta em Unidades com Médicos de Família, Enfermeiros e Secretários
Clínicos, com plena autonomia e prevê três modelos:
-O
Modelo A em que o sistema de remuneração tradicional se mantém (pensado
sobretudo para atrair os muitos médicos que estavam, bem pagos, em 42 h com
exclusividade, com 1550 utentes, e que desconfiavam do Modelo B em que
teriam uma base remuneratória mais baixa e teriam que aumentar o número de
utentes).
-O
Modelo B assente na base 1550 utentes/35 h a que acresce uma série de
suplementos, quer pelo aumento ponderado das listas, quer por qualidade
e desempenho. Num dos próximos números irei publicar um artigo que escrevi na
altura em que foram conhecidas as linhas do Modelo B em que felicitava os
colegas dos sindicatos e da APMCG por terem conseguido muito mais do que aquilo
que pensava ser possível alcançar e que me pediram para não publicar…
-
E o Modelo C em que as Unidades seriam dos profissionais e convencionadas com o
SNS.
A ideia
na altura é que haveria plena liberdade de se escolher o modelo que se quisesse
inclusive o Modelo C. Só que (em face da generosidade do modelo B)
rapidamente alguém inventou que para se chegar ao Modelo B era preciso primeiro
estagiar em Modelo A até se dar provas da “consistência e amadurecimento da
Equipa”. Depois o Ministério teria que publicar todos os anos quantas Unidades
A poderiam passar para B (e isto não estava na Lei) sendo que esse número foi
sendo cada vez mais restrito e atualmente é inferior ao número de USFs do
Modelo A já com parecer técnico aprovado para passarem para B; e a passagem só
acontece no último trimestre do ano. Em 2020 foi anunciado pela Ministra da
Saúde que só haveria novos Modelos Bs
depois de feita a Revisão do seu Modelo remuneratório.
O modelo
C nunca chegou sequer a ser regulamentado nem sequer estabelecidas as suas
linhas remuneratórias. Mais uma vez o preconceito ideológico e o medo da
comparação se impuseram.
O Modelo
B, que para os profissionais reúne o melhor de dois mundos (uma boa remuneração
e autonomia sem encargos ou responsabilidades financeiras com investimentos e pessoal),
passou assim a ser o alvo cobiçado por todos.
E para o
lado dos utentes?
Seguramente
que este modelo é muito melhor que o anterior, porque, à semelhança da Medicina
Privada, os profissionais sentem a unidades como sendo deles e a ser a sua
imagem que está em causa.
Por outro
lado, o Modelo USF está sujeito à contratualização de variadíssimos
indicadores, cujos resultados são públicos e ninguém gosta de ficar mal na
fotografia, para além de se traduzirem em suplementos remuneratórios. Por sua
vez o cumprimento desses indicadores obriga a um bom desempenho e a boas
práticas quer na qualidade, quer na eficiência, quer nos resultados.
No
entanto este modelo tão generoso para os profissionais (onde sem alterar as
leis se conseguiu pôr todos os benefícios remuneratórios possíveis – pagamento
do subsídio de exclusividade embora sem a ela obrigar; Unidades de
Contratualização [UC] pelo aumento da listas acima de 1550 utentes que
correspondem ao pagamento de uma hora suplementar, por cada mais 55 utentes tipo;
UCs pelo seguimento realizado de hipertensos, diabéticos, mulheres em
planeamento familiar, grávidas e crianças, até um total de 20 UCs;, pagamento
de 30 euros por domicílio; pagamento por se ser orientador de formação dos
internos de MGF; pagamento de 5 UCs ao Coordenar da USF) falha ao não exigir
duas contrapartidas fundamentais:
-
alargamento do horário base de 35 horas tendo em conta as horas suplementares
pagas (UCs de lista) pelo alargamento da lista de utentes
- e uma
exigência de uma acessibilidade diferente do modelo tradicional que é de 3
semanas, sendo que no modelo tradicional os médicos atendem também utentes sem
médico de família atribuído e colaboram (gastam horas) nos Atendimentos
Complementares dos ACES.
E é exatamente por estas duas falhas que o
Modelo B ainda não se afirmou e levanta dúvidas, designadamente ao Tribunal de
Contas, sendo cada mais difícil o acesso a este modelo. Isto está a gerar uma
situação de injustiça insuportável pois, enquanto existem USFs do Modelo A com
desempenho excelente, mas que não conseguem o acesso ao Modelo B e os seus
profissionais estão no regime geral da carreira medica a fazer 40 horas por
semana com o mesmo número de utentes dos colegas que estão no Modelo B a
receberem o dobro e a fazerem apenas 35 h (na sua larga maioria, conforme o
revelaram as auditorias feitas em 2018 e)
2019 e a cumprirem o mesmo Tempo Máximo de Resposta Garantida de 3
semanas.
Cumprissem
os Modelos B um regime de 40 horas e um TMRG de 5 dias úteis e seria
politicamente impossível evitar a generalização do Modelo B, com grande
vantagem para população.
Note-se
que a manutenção de horários de 35 h no Modelo B de Médicos e Enfermeiros a
receberem 9 UC de lista, se deve à passividade calculista da Administração que
todos os anos tem validado os horários de 35 horas aprovados pelos Conselhos
Gerais da maioria das USF e à falta de coragem política em enfrentar os
interesses corporativos
Pôr o
modelo B no são deve ser a luta de todos os que o querem ver generalizado.
Abrir o
Modelo C é outra luta a fazer por duas razões importantes: nos próximos 4 anos
vão reformar-se 3000 médicos de família e o número de novos MFs não chega para
os substituir. As USF do Modelo C são uma forma de manter no sistema parte
destes MF que se vão agora reformar e só assim os políticos poderão cumprir a
justa promessa de “dar um Médico de Família a todos os portugueses” e por outro
lodo pelo estímulo que a pressão competitiva e comparativa poria no Sistema.
Feitas as contas vale a pena. Vale
mesmo muito a pena.
(Texto escrito para o Jornal Médico
de Família, na altura um poderoso Jornal da Associação Portuguesa de Clínica
Geral , mas que me pediram para o não publicar)
Caros
colegas,
Na edição
eletrónica do nosso jornal têm disponível uma folha de calculo que poderão
facilmente usar para fazer as contas ao modelo B segundo o Decreto Lei aprovado
na generalidade em conselho de ministros e em discussão com os parceiros.
Como não é
crível que os sindicatos se batam para baixar o que é proposto pode desde já
analisar-se com segurança o que está em cima da mesa.
E a
conclusão não pode ser outra de que vale a pena, que vale mesmo muito a pena.
Creio que se os colegas fizerem a simulação aplicando a vossa realidade, em
breve haverá uma grande vaga de candidaturas a USF.
Assim existem
em muitos locais do País médicos com listas grande, por vezes até com 2000
utentes e sem ganharem mais por isso. No modelo B não só ganham em função do
aumento da lista como esta é ponderada. Ou seja as crianças até aos seis anos
valem
Mas além do
aumento da lista ganham ainda pelas atividades realizadas: Seguimento de
Diabéticos e de Hipertensos, consultas de vigilância em Planeamento Familiar,
Saúde Materna e Saúde Infantil. Estas atividades também são convertidas em
Unidades e cada 55 Unidades correspondem a mais uma Hora. A soma destas horas,
chamadas Unidades Contratuais somam-se à Unidades Contractuais referentes ao
aumento da lista, sendo pagas pelo mesmo valor. O conjunto de UC pagas tem como
teto as 20 UC
Os domicílios também são pagos, 30 € cada com um limite de 20 por mês
Nos locais
aonde exista alargamento de cobertura, a partir das 20 e aos fins de semana o
pagamento será feito pelo valor hora de 180 € e de 230 € respetivamente. Estes
valores são pagos ao grupo pelo que têm que ser divididos pelo número de
médicos da USF.
Embora não
obrigue à exclusividade, e tenha desaparecido o artigo que na proposta de
Novembro impedia o atendimento na privada de utentes da USF em que se
trabalha, a remuneração tem sempre como
base as 35 h com exclusividade. Isto implica que, para aqueles que têm apenas
as 35 h simples, a adesão a este modelo resulte numa duplicação ou quase
triplicação do vencimento. Ainda por cima contando para a Reforma, que assim pode
vir a ser, quase à última da hora, substancialmente acrescida. Não acredito que
haja alguém que estando em 35 h simples, depois de me ler, não corra a iniciar
o processo de constituição de uma USF.
O subsídio
de natal e de férias é pago, apenas pelas 35 h com exclusividade. Mas para a
Reforma conta tudo menos os domicílios e o alargamento de cobertura (horas
depois das 20 e ao fim de semana).
Finalmente
os orientadores de internos do complementar vão finalmente ter uma remuneração
própria (4 UC=4x130 €= 520 €) enquanto tiverem um interno ,e os coordenadores
também vão ver o seu muito trabalho pago com 7 UC (910 €). Ambas estas
remunerações são extra e não entram para os limites.
Mas se para
os que estão em 35 horas simples não há razão para hesitações a verdade é que
para os que estão em 42 com exclusividade também não. Para além do gozo que dá
trabalhar em autonomia em equipa, de sentir a USF como nossa e como uma
realização nossa, financeiramente também é muito compensador. Façam as contas.
Como sabem
não sou politicamente afeto ao partido do governo e fui a única pessoa que
neste jornal levantou sérias dúvidas ao Relatório da Comissão para a Reforma
dos Cuidados de Saúde Primários que deu origem a este processo. Não que fosse
contra o modelo proposto mas porque não acreditava que fosse possível de
conseguir do governo uma proposta tão arrojada como esta e apostando-se todos
os ovos neste único cesto, ficaríamos sem alternativas. Terminei esse artigo
dizendo esperar que os colegas da Comissão viessem a demonstrar que eu estava
errado. Conseguiram-no. Parabéns à Missão.
António
Alvim
antonioalvim@netcabo.pt
Ps O meu
último artigo teve o titulo de “E se não houvesse Centro de Saúde? ” Foi um
erro que levou muita gente a passar à frente sem o ler e a ficar com uma ideia
errada.
Devia ter
sido “ E se fossem só USFs ?”, Releiam-no sob essa luz. Este diploma pode ser o
ponto de partida para isso.
3.3 Mail enviado para rede de mail “usfamiliar” onde estavam todos os
profissionais das USF na altura.
***********************************************************************
De: antonioalvim <antonioalvim@netcabo.pt>
Enviado: 17 de julho de 2009 11:14
Para: usfamiliar@yahoogrupos.com.br
Assunto: Cargas Horárias no Modelo B . Unidades ponderadas...
Cargas Horárias no Modelo B
Horários no modelo B sempre foi um
tema Tabu. E era bom que o não fosse e que o assunto fosse discutido
abertamente e esclarecido de uma vez por todas.
Isto porque as cargas horárias estão
directamente associadas a duas coisas: Acessibilidade e Remunerações. E estas
duas coisas são, quer se queira quer não, as duas peças fundamentais para que o
Modelo B se consiga manter, independentemente de quem forem os Ministros da
Saúde e os seus Partidos.
O modelo B é um excelente modelo
remuneratório para todos os grupos profissionais. Os Médicos têm mesmo das mais
altas remunerações no sistema público (e mesmo no privado) , a nível de
Ministro ou de gestores públicos. E não levam preocupações ou responsabilidades
para casa e passam os fins de semana descansados.
Em Portugal apenas se pagam
remunerações deste nível a quem assume importantes responsabilidades e para
quem a questão dos horários não se põe. Trabalham no mínimo das 8 às 20 e
geralmente mais (Sempre que é preciso o que é quase sempre). Não há ninguém que
ganhe o que os médicos ganham por trabalho efectivo de apenas 35 horas. Note-se
que estou falar de trabalho efectivo e não de actividades não assistenciais que
são feitas (????) em casa.
Assim este modelo só se justifica e
só se pode manter se satisfizer os nossos clientes, razão de ser dos nossos
contratos e quem nos paga. Os cidadãos e o poder político. E a acessibilidade é
um dos factores mais importantes da sua satisfação.
Ora para se garantir a acessibilidade
as cargas horárias têm que estar organizadas de forma a garantir que um utente
consiga marcar uma consulta “normal” num prazo de 5 dias. A carga horária
semanal tem que estar adequada à procura semanal. Porque se não der resposta em
5 dias isto quer dizer que a procura é superior à oferta e que todos os dias
vão sobrar utentes que não conseguiram marcar consulta naquele prazo, e vão
ficar para a semana seguinte. Ou seja, os que sobram vão se acumular levando ao
aumento progressivo da lista de espera. Por exemplo: se por semana sobrarem 10
doentes, ao fim de um mês sobraram 40 ou seja um atraso de dois dias. Ao fim de
um ano o atraso será de 20 dias e por ai adiante.
Assim, a única forma de ser possível
dar resposta à procura trabalhando com qualidade é incorporando as UCs, por
aumento de lista, nas horas assistenciais e nos respectivos horários.
A sobrevivência a prazo do Modelo B
está no assumir por todos este princípio e o de dar resposta em 5 dias úteis a
qualquer pedido de consulta pré marcada. Evidentemente que a seguir a ausências
haverá atrasos mas a sua recuperação tem que ser assumida.
O principio e a liberdade, de
que não nos devemos preocupar com horários mas com o dar reposta aos utentes,
não pode servir para se trabalharem menos horas do que é suposto, antes pelo
contrário significa disponibilidade para se trabalhar mais se necessário.
É possível manter a
acessibilidade em 5 dias?
É. Eu que tenho uma lista pesada
envelhecida e de quase 2000 utentes, com uma boa taxa de utilização e com uma
utilização alta, tenho conseguido manter a procura em 5 dias tendo geralmente a
agenda do sexto dia útil (e seguintes) completamente limpa. Não temos consulta
aberta. Incorporo todas as 9 UCS no meu horário assistencial. Por cada três
consultas da agenda deixo 2 em aberto para utentes do dia. Deixo ainda em
aberto as duas últimas consultas de cada período. Faço um período de consulta
de manhã e à tarde todos os dias, exceto um dia por semana em que só trabalho 5
horas à tarde. Em quatro dias da semana termino às 20 h
Agora que alguém levantou esta
questão das UCs e Horários parece-me oportuna esta reflexão porque tendo
visitado alguns sites de outras USFs de modelo B tenho encontrado apenas
horários de consulta muito reduzidos como se fossem os antigos horários de 35
horas que nem sequer incorporam as 6 horas da urgência que aquele
modelo contemplava. Por outro lado, parecem sobretudo organizados para dar
resposta aos objetivos de contratualização, com consultas específicas de
Diabetes e Hipertensão e como uma reduzida oferta de consulta geral. E na
verdade é perfeitamente possível cumprir 100% os indicadores contratualizados
com horários reduzidos. O que não é possível é garantir a acessibilidade.
E esta não se reflete nos indicadores escolhidos. Mais, a Medicina Geral e
Familiar não se esgota na Medicina preventiva, muito longe disso, e não é compatível
com abordagem segmentada de um doente por patologias.
Os colegas da minha USF perguntam-me:
-Não somos nós que estamos a ser parvos e a trabalhar de mais?
Respondo-lhes. Não, estamos a fazer o
certo e aquilo por que nos pagam. Porque se o não fizermos mais dia menos dia o
Modelo B acaba.
Notas finais: Trabalhar
numa USF no Modelo B só por si não dá direito a ganhar mais. Dá sim hipóteses
de ganhar mais a quem assuma o compromisso de aumentar as suas listas e em
correspondência aumentar as suas horas assistenciais. As UCs por aumento de
lista não são prémio por se estar numa USF. São remuneração compensatória por
mais horas de trabalho. Os prémios e incentivos estão nas UCs assistenciais e
nos incentivos financeiros e institucionais. Que também não são prémio por se
estar numa USF mas sim prémio por um bom desempenho. Estar numa USF modelo B permite
sim o acesso a esses prémios se forem devidos,
E o que se diz acima tanto será
válido para médicos como para os outros grupos profissionais (embora
também seja verdade que os médicos têm um prémio por estar no modelo
B, que é o de receberem o suplemento da exclusividade a que deveria
corresponder o facto de em circunstância alguma as funções privadas
poderem condicionar ou interferir com a disponibilidade necessária para a USF).
O argumento de que a lei refere as 35
horas pelo que não tem que se fazer mais horas nem estas são necessárias, é um
argumento perigoso, que um dia não deixará de ter a conclusão de que não sendo
necessárias nem feitas, e não sendo um incentivo, o pagamento das UCs por
aumento de lista não tem qualquer sentido. E deixarão de ser pagas…
Vocês me dirão se estou lúcido ou se
estou louco.
António Alvim
3.4 A consulta a 5 dias
Texto publicado do Jornal Médico de Família
em Novembro 2011 (edição 222).
É possível um utente conseguir marcar uma consulta para o seu Médico de
Família num prazo até 5 dias úteis?
É! O exemplo abaixo demonstra-o. No
dia 10 de Novembro na minha agenda para o dia 17, a quinta-feira seguinte (único
dia da semana em que faço apenas um período de consulta) apenas estava um
doente marcado. E as dos dias seguintes, estão absolutamente vazias.
E a minha lista tem 1903 utentes, é
idosa com 530 utentes com mais de 65 anos. Tenho 13 unidades contratualizadas
(UC) de aumento de lista (quando o máximo que pagam é 9).
E é uma lista utilizadora com uma
taxa de utilização de 63% e uma taxa de consultas pelo próprio médico superior
a 90% (atendo praticamente todas as urgências/situações agudas dos meus utentes
- os 10% de consultas que faltam correspondem aos períodos de ausência e a
citologias feitas aos meus doentes por outros colegas das USF) e sou de longe o
médico que mais consultas fez a utentes de outros colegas, sendo o saldo
largamente positivo a meu favor.
Trabalho dia e noite? Não. Tenho de
horário assistencial expresso de 35 horas. Habitualmente faço até mais 4 horas
(misto de assistenciais e não assistenciais) por semana. Faço ainda, em média,
dois domicílios por semana e tenho duas reuniões USF, de 1 hora cada, por
semana. O total andará à volta das 42 horas por semana. Não faço citologias. O
trabalho não assistencial vai sendo feito ao longo do dia.
Como podem constatar, a minha
consulta está organizada de forma a deixar dois “buracos” entre cada 3
consultas pré marcadas e outros dois no final de cada período. Esses buracos
destinam-se a encaixar, ao logo do dia, as situações agudas, à medida que estas
vão surgindo e a recuperar atrasos. Quando não aparecem muito raramente ficam
todos preenchidos, aproveitando-os para as actividades não assistenciais,
incluindo pausa para o café…
Cumpro os indicadores? Sim, tenho
regularmente cumprido todos os indicadores excepto os das citologias ( a ver se
é desta!).
As linhas acima não são para me
vangloriar mas para demonstrar que com organização e dentro de um horário de 42
horas, é possível dar resposta cabal e personalizada aos utentes e garantir-lhes
acessibilidade em 5 dias úteis.
É importante oferecer uma acessibilidade em cinco dias?
Sim, é muito importante.
Por duas ordens de razões, a primeira
das quais, puramente matemática: se a oferta semanal for inferior à procura,
quer dizer que vão sobrar doentes e que estes se vão acumular e o tempo de
espera vai progressivamente aumentando até se estabilizar por equilíbrio entre
a procura e as desistências (quer por entretanto se ter resolvido a situação
que motivou o pedido de consulta, ou por o utente ter ir procurado solução
noutro lado. Vergonha nossa).
Outra razão, mais de fundo, tem a ver
com a essência do conceito de Médico de Família. Conceito assente numa relação
continuada no tempo e baseada na confiança. Se as vertentes de promoção e
prevenção da saúde podem ser programadas, já os cuidados assistenciais
requeridos por uma multiplicidade de factores físicos, psicológicos, sociais, culturais e existenciais, não.
Ou o médico do utente está disponível num prazo curto, ou o momento passou. E
isto tanto é verdade para uma pneumonia em início, como para o sofrimento
gerado para uma crise conjugal.
A confiança de se poder recorrer em
tempo útil ao “seu” médico de família é assim estratégica em MGF.
Cito Juan Gervas: el tiempo máximo
para ver al propio médico de cabecera ("mí médico") no debería ser
mayor de 24 horas; en otro caso el médico general se convierte en médico de
pacientes crónicos estabilizados obedientes y bien organizados (justo el grupo
de pacientes que no necesitan médico) -la flexibilidad horaria y de atención en
clave en Medicina General”.
Assim, a prática assistencial em
Medicina Geral e Familiar, deve estar organizada para dar resposta às situações
agudas no próprio dia e a todas as demais no espaço de uma semana, porque nunca
se sabe quais as que podem esperar e as que não podem.
Perguntarão: e o aumento da oferta
não leva a um aumento da procura, tornando insuportável a vida de um médico?
A resposta é não! O facto de a lista
ser limitada leva que a procura não aumente. Em dois anos seguidos, tive
exactamente o mesmo número de consultas.
Por outro lado, a oferta em cinco
dias torna a vida da USF mais calma e desaparece a pressão diária de todos
aqueles que dizem que não podem esperar 3 semanas.
A Consulta a 5 dias e carga horária
assistencial.
O DL das USF, bem com a portaria do
Modelo B, nunca foram muito explícitos sobre a definição das cargas horárias e
as equipas regionais de acompanhamento (ERA) que chumbam a passagem a Modelo B
de uma USF por faltar uma acta, também não, preocupando-se apenas com os
programas.
Assim, têm-se desenvolvido duas teses:
- Os que consideram que o DL apenas
fala em 35 horas e cumprimento dos indicadores.
- Os que consideram que o pagamento
das UC por aumento de lista se destina a pagar o aumento de trabalho
correspondente e que aquelas UC se devem traduzir num aumento de horas.
No limite, as USF que subscrevem a
tese das 35 horas tendem a organizar as suas cargas horárias em torno das
actividades dos programas relacionados com os indicadores e deixam o resto para
consultas abertas e atendimentos complementares
internos, em regime de inter-substituição. Têm como referência, para se
conseguir uma consulta programada, as 3 semanas, de acordo com Portaria 1529/2008 de 26/12/2008, optando, neste caso, por
se igualizarem às UCSP, ao contrário de tudo o resto em que, inclusive, aceitam
encargos superiores aos definidos legalmente na carteira de serviços das USF
(mamografias e citologias de rastreio sistemático em vez de rastreio
oportunístico).
Ora, esta
segunda tese, que permite o absurdo de médicos que estavam em 42 horas venham
para uma USF B ter mais doentes, ganhar mais e trabalhar menos 7 horas,
parece-me uma fraude. Quer face ao Decreto-Lei, quer aos utentes, quer aos
contribuintes!
Face ao
Decreto-Lei porque não respeita a liberdade que ele deu para as USF se auto-organizarem
para o cumprimento dos seus objectivos assistenciais.
Face aos
utentes, porque ao não se contemplar um aumento de horário correspondente às UC
pagas por aumento de lista, está-se-lhes a roubar a possibilidade de conseguir
mais cedo uma consulta com o seu médico.
Face aos
contribuintes, porque estão a pagar por um aumento de horas (e serviço
correspondente) que não acontece.
O Decreto-Lei
estabelece que a remuneração base, 35 horas, corresponde a uma lista mínima de
1917 unidades ponderadas (UP). Ora, das duas uma: ou se considera que as 35
horas são necessárias para uma lista de 1917 unidades e que daí para cima são
precisas, proporcionalmente, mais horas para manter a mesma qualidade de
atendimento, ou então que, afinal, as 35 horas são a mais para aquela lista
base e então a lista base devia aumentar. E não nos esqueçamos de que as
primeiras seis UC têm uma ponderação de 1,8.
A questão
não reside, contudo, no número de horas. Mas no serviço que se presta ou não
presta. É com a barreira nas 35 horas.
Em resumo:
as consultas a 5 dias numa USF B são possíveis, dentro da carga horária
aceitável que é aquela que tem como limite as UC de aumento de lista pagas. A
carga horária a praticar, em cada momento, deveria ser a necessária para
cumprir este objectivo, dentro do referido limite de 35h+UC pagas pelo aumento
de lista.
Indicadores de acessibilidade em
falta
Dirão
alguns: mas nós cumprimos com a carta de compromisso e respectivos indicadores
que contratualizamos. Logo… Não nos deve ser exigido mais nada.
Pois. Mas
verdade é que a vertente assistencial não está contemplada nos indicadores.
Porque quer os colegas envolvidos na escolha dos indicadores quer o ACSS apenas
privilegiaram a vertente sanitária. E ainda recentemente ouvi um colega
defender o aumento dos indicadores para que as USF perdessem a capacidade de se
organizarem especificamente no sentido de responderem aos indicadores de modo a
garantir que os que cumprissem seriam aqueles que desenvolviam naturalmente uma
boa prática. Há aqui um incompreensível desfoque elitista, com a agravante de
se esquecer a vertente assistencial.
Dirão: Não
há forma de monitorizar a vertente assistencial.
Ora, a
vertente assistencial pode ser medida pela disponibilidade do médico para
atender os seus utentes. Porque se estes têm facilidade de chegar ao seu
médico, e chegam, então o médico tem que lhes dar resposta aos seus problemas.
Assim propõe-se que se juntem aos indicadores de taxa de utilização e taxa de
consultas pelo próprio médico, os seguintes indicadores:
- taxa de
consultas marcadas entre 1º e 5º dias úteis;
- taxa
de consultas marcadas entre o 1º e 10º
dias úteis e;
- taxa de
consultas do dia feitas pelo próprio médico;
- taxa de
consultas do dia feitas pelo próprio médico/total de consultas feitas pelo
próprio médico.
As USF do
modelo B, mesmo com as questões que abordo neste texto, protagonizam um extraordinário
salto qualitativo nos cuidados de saúde primários. Todas as avaliações o
demonstram.
Com aquilo
que aqui se propõe, elas seriam perfeitas.
3.5 10 anos de Escândalo na Reforma dos Cuidados de Saúde Primários,
A
razão e a solução.
(2018 06 25)
A Reforma Dos Cuidados de Saúde
Primários foi uma Reforma fundamental dos Cuidados de Saúde e sobre a qual
existe consenso político e que todos os estudos revelam como muito positiva em
relação ao paradigma anterior. O Modelo B, “entregando” as unidades aos seus
profissionais, remunerando o esforço (até 9 horas por aumento de lista)
avaliando e premiando o desempenho (Incentivos financeiros e
incentivos institucionais) foi peça
chave para o arranque e sucesso da
Reforma.
Contudo existe um escândalo (a meu
ver, o leitor dirá se concorda comigo) na Reforma dos Cuidados de Saúde
Primário que sob uma conspiração de silêncio dura desde o seu início há 10
anos.
Este artigo, que não é contra
ninguém, e será um disparate ir-se por aí ou encetar uma caça às bruxas, deve
ser visto como um contributo para a pôr nos carris uma boa Lei, mas que desde o
princípio e em muito lado não entrou o trilho devido. Se a Lei tivesse sido
cumprida os seus resultados seriam muito, muito melhores.
Para se perceber do que falo veja-se
o horário deste Médico, coordenador de uma USF de Modelo B, com 9 Ucs (horas) de aumento de lista, recebendo um
vencimento superior a 7000 euros
Três tardes livres em que os seus utentes não
podem aceder a ele
Apenas 28 h de agenda para
consultas, 3 h não assistenciais (GC-Gestão Clinica), 35 horas totais de
horário sendo que duas delas estão alocados a domicílios que o Estado
(utentes/contribuintes) paga à parte, pelo que estão a ser pagas duas vezes.
Este médico, com este horário,
ganha ilíquido mais que 7 000 euros , ganha mais do que o Primeiro
Ministro incluindo neste as ajudas de custo, sem ter que fazer noites nem fins
de semana, sem levar preocupações para casa, sem uma atividade médica
stressante como se fosse neurocirurgião ou cirurgião cardíaco
Este Médico a quem o Estado paga
para além das 35 h base, 9 horas (9 UCs-
unidades Contratuais) para aumentar a sua lista de 1550 utentes para 1750,
sendo que paga as 6 primeiras com um fator de 1,8 e ainda paga subsídio de exclusividade sem o
obrigar a ela, 11 horas de incentivo de desempenho, 4 horas por ser orientador
de internato, e 30 euros por domicílio e assim ultrapassa os 7000 euros mês,
ganha bastante mais do que o dobro do que os seus colegas que com a mesma
categoria e o mesmo número de utentes igualmente orientadores de internato, e
fazendo domicílios, estão em USFs do
Modelo A ou em UCSPs (modelo tradicional) a trabalharem 40 horas, sendo 35 de
agenda. E três vezes mais do que os
médicos que estão em 35 h simples, sem exclusividade tal como ele, e com um
horário igual ao que ele pratica.
Este médico, coordenador de uma
USF de Modelo B, escreve aos profissionais que não há norma legal contrária e
que os horários na USF estão superiormente aprovados, pela direção executiva do
ACES, e por isso tudo bem.
A questão é que contrariamente ao
que este coordenador diz (e muitos outros) existe norma legal que diz que os
horários de 35 h, para quem tem 9 UCs (Horas)
de aumento de lista, não estão conforme a Lei. E isto desde que foi
criado o Modelo B em 2008. Há 10 anos que a Lei não é cumprida.
O verdadeiro problema , está na
Administração que nunca soube ler, compreender e aplicar a lei, o que permite que estes horários escandalosos
(para quem tem listas que dão direito a 9 UCs) existam em muito lado, aprovados
por ela, desde há 10 anos , praticamente
em toda a cidade de Lisboa por exemplo, e em muitos locais do País, dizem-me,
existindo uma espécie de conspiração de silêncio, quando os contribuintes/ utentes pagam 44 h,
constituindo quase como que uma “burla”, consentida, e aprovada, que envolve
muitos e muitos profissionais, atingindo assim, nestes 10 anos, muitos milhões
de euros pagos sem a devida contrapartida para os utentes.
O que falhou na parte da Administração?
Disse acima , o verdadeiro problema, está na Administração que nunca soube ler,
compreender e aplicar a lei
Há uns três anos o meu
coordenador de então disse-me que a Direção Executiva do ACES lhe tinha dito
que o meu horário de 40 h não podia ser aprovado pois só poderia ser de 35 h.
Reclamei superiormente e o assunto subiu mesmo até ao ACSS, entidade que
superintende todo o SNS. E a resposta do ACSS, citado apenas aquilo que diz a
lei deu-me razão.
Face ao exposto, e independentemente, até, do regime
de trabalho de origem de cada um dos profissionais - seja ele o regime de
dedicação exclusiva a que correspondem de quarenta e duas horas
semanais, ou aquele a que correspondem trinta e cinco horas
semanais — nada impede que o respetivo trabalhador médico,
enquanto integrado numa USF, possa praticar um horário a que correspondam 40
horas semanais, desde que tal seja objeto de acordo e resulte do regulamento
Intemo da respetiva IJSF e essa carga horária se mostre adequada ao
respetivo plano de ação, o período de funcionamento e cobertura
assistencial contratualizada,
Mas apesar de me ter autorizado
as 40 horas nem assim a Administração compreendeu a Lei .
A chave está no que diz o parecer
do ACSS : que a carga horária se mostre adequada ao Plano de Acção e à
Cobertura Assistencial contratualizada.
O problema é que a Administração
(diretores executivos dos ACES) continua presa ao registo burocrático normativo
do paradigma anterior à Reforma, e entretém-se a certificar os Fs e Rs dos
horários, se estão de acordo com os normativos, e esquece-se do essencial.
Esquece-se da substância. Se estão de acordo com a dimensão e características
da lista e com as necessidades assistenciais.
Mesmo que o horário acima tivesse
44 h, três tardes livres em que os utentes não têm como aceder ao “seu” médico,
seria um facto só por si razão suficiente para que, em Modelo B, este horário
nunca pudesse ser aprovado.
As USFs são unidades públicas em
que os profissionais gozam de autonomia, mas para cumprir um plano de ação e um
compromisso assistencial acordado com o ACES e não para fazerem aquilo que
quiserem e como quiserem.
O que os Diretores Executivos dos
ACES não assumiram, porque algures no processo de implementação da Reforma este
passo se perdeu, é que a Lei da Reforma dos CSPs lhes atribui, de forma muita
clara, o papel de contratualizadores da Assistência aos Utentes tornando-os
responsáveis por negociar e contratualizar um plano assistencial, o qual, como
a lei diz, obviamente tem de contemplar a oferta de consultas em função da
dimensão e características da lista. Ou
seja, em função das Unidades Ponderadas da Lista. Sendo que o Estado paga 1 h
por cada 55 unidades ponderadas (44 utentes tipo) acima das 1917
correspondentes a 1550 utentes que ficam à disposição dos DE na
contratualização.
Como isto não estava a ser
aplicado, e para que não houvessem dúvidas, o Ministério da Saúde publicou uma
alteração da Lei tendo ficado
2 - Nas USF modelo B, o
horário de trabalho deve ter como base as 35 horas com incrementos ajustados às UC do suplemento associado às unidades
ponderadas da lista de utentes, previstas no artigo 30.º, 32.º e 34.
Ou seja, o Estado não definiu
exatamente 1 UC <> 1 h, deixando assim, com inteligência, uma margem
negocial, mas deixou inequívoco que as horas pagas pelo o aumento da lista
(UCs/UPs) são pagas porque o aumento de lista requer mais horas de trabalho. E
se as paga por isso espera que isso se reflita na contratualização dos
horários.
Os sindicatos não se opuseram a
esta alteração de lei, porque sabiam que ela apenas explícita aquilo que já
estava na lei, a qual tinha tido o seu acordo e respondia à sua reclamação:-
Mais utentes, mais trabalho , mais horas necessárias que devem ser pagas. As
tais UCs de aumento de lista.
Mas, tendo a alteração da Lei
sido publicada há precisamente 1 ano (2017 06 21) a Administração não acordou
(por orientação política?) não ligou à Lei e continuou a aprovar horários de 35
h a quem tem 9 horas (UCs) pagas de aumento de lista, como o acima, sem ligar à
lei. Preocupando-se, apenas, em certificar se o plano do horário tem todos os
slots devidos. Se a oferta de consultas é insuficiente para a dimensão e
características da lista isso não a preocupa.
Por outro lado, não cumprido o
que nesta matéria lhe compete a Administração inventa coisas que não estão na
lei. Assim nuns lados não se liga ao que está na lei e exige-se aos Médicos o
cumprimento da carga horária de 42 correspondentes ao regime em que estavam
anteriormente. Noutros fizeram 40 h para toda a gente (o que , para os Médicos
com 9UCs, até tem fundamento conforme
parecer jurídico publicado na revista do Sindicato Independente dos Médicos,
uma vez que desde 2012 as 40 h passaram a ser o regime geral das carreiras
médicas), noutros deixam-se os Médicos
cujo regime anterior era o de 42 h fazerem 35 h apesar de receberem 9 Ucs de
aumento de lista e na mesma unidade, os médicos que entraram depois de 2012 e
estavam em 40 h exige-se-lhes manterem 40 h , quando, como bem explica o
parecer acima do ACSS , os regimes anteriores não interessam e todos os
Médicos estão em circunstâncias iguais,
contando apenas a dimensão ponderada da lista
São 10 anos em que em muitos
lados (não em todos diga-se) os utentes não tiveram o acesso que deviam, e
pagaram, aos seus médicos. A oferta
insuficiente de consultas leva a tempo de espera demasiado longo (com impacto
na saúde dos utentes), o qual se depois se traduz por uma pressão muito grande
para consultas do dia para a qual os médicos não têm capacidade de resposta,
conduzindo a um mau funcionamento da Unidade e a uam sensçºao de ”afogamento” e
sobrecarga para os Médicos.
Se se cumprisse a lei a espera
por uma consulta com o seu médico de família poderia, como deve ser, não ser
superior a 5 dias e as coisas fluiriam muito melhor.
Soluções
Quando denunciei estas situação
num debate sobre a Saúde em Lisboa, promovido pelo PSD de Lisboa, que depois o
Saudeonline relatou (link) , o Secretario de Estado pediu uma auditoria à
ARSLVT.
Entretanto, passado um ano sobre
a alteração da lei acima referida, as ARSs ainda esperam orientação da ACSS e
os Diretores Executivos dos ACES esperam orientações da ARSs e os coordenadores
das USFs B e os demais profissionais, continuam com os seus os horários, como o
acima, aprovados
E o meu palpite é que o ACCS vai dizer apenas,
como da outra vez, vejam e façam o que diz a lei.
Sugiro que se organize uma
conferência (promovida pela Coordenação da Reforma dos Cuidados de Saúde
Primários? Aliás o que tem o seu Coordenador a dizer sobre este assunto que
devia ser a sua primeira preocupação e responsabilidade?) sobre este tema para a qual se convide o
ACSS, os Diretores Executivos dos ACES e os seus Presidentes dos Conselhos
Clínicos, o Coordenadores das USFs em Modelo B e os parceiros sociais, e se
consensualize com inteligência a forma de aplicar a lei. A qual diga-se, é uma
Boa e Muito Importante Lei, sendo pena que não esteja explorada em toda a sua
potencialidade.
~
Quando se iniciou o Modelo B
construí um Calculómetro que a ARSLVT usou nos primeiros tempos para calcular
os vencimentos, complexos, a pagar aos profissionais no modelo B. Hoje deixo
uma tabela de como calcular com bom senso, os incrementos referidos na lei.
Creio que uma decisão política no sentido de a implementar resolvia todos os
problemas.
Horas de Agenda são horas de
oferta de consultas que têm que ter o horário expresso.
Horas de Sysqual – são o total
mínimo obrigatório de permanência semanal na USF e que é aferido pelo Sistema
de Controlo Digital, Sysqual
Horas não assistenciais- São
horas sem doente. Não precisam de estar expressas no horário devendo ser de
livre gestão pelo médico, mas ao fim da semana as horas de Sysqual têm que
estar cumpridas.
Horas de disponibilidade (Horas
até) .- São horas não expressas nem obrigatórias, mas que são pagas- a
diferença entre as horas de Sysqual e as horas pagas (35h+ UCs) de aumento de lista) e que cobrem todas as
vezes que o médico tem que sair mais tarde porque a consulta se atrasa, horas
dadas para compensar a falta de um colega, etc…
Mínimo na semana- Horas de Sisqual
+ Domicílios
Como os domicílios são pagos por
cada um, poderão ou não ser incluídos nas horas de carga horária; não entram
nas horas de Sisqual.
Contudo o importante são as Horas
de Agenda e de Sisqual. O restante é de gestão livre do Médico e não precisa de
controlo
A alta remuneração dos Médico em
Modelo B é do tipo das remunerações que se pagam por Responsabilidade e não por
um horário definido. Neste caso pela responsabilidade do correto seguimento e
atendimento de uma lista de utentes. Contudo há um mínimo que importa garantir:
O Horário de Agenda e as Horas de Sisqual (horas mínimas de permanência na USF)
Ps A razão deste artigo não está na tentativa do
meu saneamento na minha unidade, onde o
coordenador pôs a votação a minha expulsão, na sequência das minhas declarações
à RR por suposto delito de opinião , sem
o assunto ter sido posto previamente à discussão, sem direito a contraditório, e sem sequer eu ter sido ouvido ou alguém
falado comigo, facto que importa denunciar, e não mais do que isso, porque
ocorreu num serviço público. Aproveito para agradecer, muito, aos profissionais
que apesar da minha posição lhes poder vir a complicar a vida, votaram contra a
minha saída.
Não é contra os profissionais nem
contra a Administração. Antes pelo contrário.
Este artigo acontece sim porque
apesar do impacto da denúncia feita, ainda não se percebeu a dimensão da
questão, onde está o erro e qual a solução. E é para chegar à solução, depois
de 10 anos a chamar particularmente a atenção, e em consequência do facto de
passado um ano da alteração da lei tudo continuar na mesma e assim iria
continuar, que tudo isto acontece.
Porque o que sempre me interessou
é ter a USF, que há 18 anos criei, sendo uma das 19 USFs pioneiras do Regime
Remuneratório Experimental, de cuja avaliação muito positiva resultou a Reforma
dos Cuidados de Saúde Primários e que durante 10 anos coordenei, com grande
satisfação dos utentes, conforme inquérito de Satisfação da Nilsen de 2009
realizado às USFs e Centros e Saúde da ARSLVT em que ficámos à frente em todos
os itens, e ao nível da excelência, exceto nas instalações que na altura eram
miseráveis, a funcionar bem e a justificar o que é pago.
A minha e as outras (e há muitas que funcionam
muito bem), para que os portugueses tenham direito a tudo aquilo que tão
generosamente pagam, e para bem deles se afirme o sucesso desta Reforma e mais
USFs de Modelo B possam acontecer e se generalizar este modelo.
Deixo como sugestão e desafio
final: que , “A consulta em cinco dias com o seu Medico de Família ”, passe a
ser a nova bandeira da Reforma dos
Cuidados de Saúde Primários. Se se cumprir o que é suposto, isto é possível. Os
Portugueses pagam-no, os Portugueses merecem-no.
3.6 Os Diretores Executivos dos ACES, as USFs
do Modelo B e a Lei
(2019 01 25)
Este artigo é escrito numa atitude preventiva que evite a continuação
da “Demissão” dos Diretores Executivos dos ACES do cumprimento dos seus deveres
e obrigações na "Validação" dos horários das USF, que dura há 10
anos e que tem permitido a prática de horários bem inferiores aos
previstos na Lei e, sobretudo, com prejuízo dos legítimos interesses
dos Utentes. Quer pela oferta de um número de horas insuficientes
(apesar de pagas e bem pagas) que limita a acessibilidade e prejudica
o bom funcionamento das Unidades, quer por "tardes
livres" que não estão de acordo com a lei e sobretudo porque a partir
da 13 h o doente não mais tem acesso ao "seu médico" nesses
dias. E na convicção que, apesar da dificuldade e incómodo provocado a quem se
deixou nestes dez anos enraizar a ideia que eram só 35 h e a isso adaptou a sua
vida, se for generalizadamente aplicado o previsto na Lei será grande o benefício
da acessibilidade acrescida ficando claramente demonstrada a mais valia deste
modelo pelo que deixará de haver reticências ao alargamento a novos modelos Bs,
sobretudo a todas as USFs que têm parecer técnico aprovado. Alargamento
que terá os cidadãos como primeiros beneficiários.
Depois de há quase seis meses ter
sido referido https://saudeonline.pt/2018/05/14/membro-da-concelhia-de-lisboa-do-psd-denuncia-pagamentos-ilegais-a-medicos/
que na ARSLVT os Diretores Executivos dos ACES aprovavam horários que
não estavam conforme a Lei conforme no texto anterior se explicou e que por
enquanto tudo continua na mesma; apesar duma auditoria ao assunto na
Administração Regional de Saúde da Região de Lisboa e Vale do Tejo, que depois foi replicada nas outras ARSs
desconhecendo-se em absoluto os seus resultados, os quais deviam ser públicos
conforma a desejável e apregoada transparência no SNS que todos queremos, mas
cuja não publicação e replicação nas outras ARSs indicia o
reconhecimento da gravidade e dimensão da questão, de comunicados
dos Sindicatos Médicos https://www.simedicos.pt/pt/noticias/4169/comunicado-horario-de-trabalho-em-usf-modelo-b/
e da
USF-AN https://app.box.com/s/1cc7sd5jrtvbtqbsoqf17vv7uohfwda1,
reconhecendo o óbvio e do Coordenador Nacional da Reforma do SNS na
área dos Cuidados de Saúde Primários ter emitido há dois meses um Parecer,
https://app.box.com/s/rqtvp2ucmirrrpygr82nfphk1m9r3zsh
que é um esclarecimento (que o
pagamento de uma UC de aumento de lista correspondia ao
pagamento de 1 hora de trabalho e porque era suposto que essa hora fosse
necessária) e uma proposta de solução dirigida aos coordenadores das USFs B mas
também aos Diretores Executivos.
Contudo parece que finalmente se
começa a debater o assunto.
E uma das primeiras questões
que se coloca é qual é o papel de um Diretor Executivo e quais as
suas responsabilidades.
Segundo o DL das USFs um
Diretor Executivo intervém nas seguintes circunstâncias:
Aprecia o Regulamento Interno (e
este deve conter a forma como a USF se organiza incluindo os
horários)
artigo 10 nr 3 -
Cada USF elabora o seu regulamento interno e submete-o ao centro de saúde, que aprecia
da conformidade do mesmo com o plano de ação previsto no artigo 6.º do
presente decreto-lei.
Homologa o coordenador
d) Propor a designação de novo
coordenador a qual está dependente de
homologação do diretor executivo do ACES;
Acorda o compromisso
assistencial explícito no Plano de Ação
3 - O compromisso assistencial
é formalizado anualmente, mediante carta de compromisso acordada entre o coordenador da USF e o diretor executivo do
Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) e objeto de publicação na página
eletrónica da ARS, da qual deve ainda constar…
Valida os horários aprovados pela
USF em Conselho Geral
3 - Os horários dos
profissionais são aprovados em conselho geral e submetidos pelo
coordenador a validação pelo diretor executivo do ACES.
Por outro lado, as
USFs são Unidades do ACES e, sem prejuízo da sua autonomia, estão sujeitas
à hierarquia (nr. 5 do artigo 3)
4 - A atividade das USF
desenvolve-se com autonomia organizativa, funcional e técnica, integrada numa
lógica de rede com outras unidades funcionais do centro de saúde ou da unidade
local de saúde.
5 - Sem prejuízo do disposto
no número anterior, as USF são parte integrante do centro de saúde.
Do acima dito fica claro que
as USFs não são unidades independentes, propriedade dos
profissionais, cujo Conselho Geral pode deliberar o que entender, mas
unidades públicas do SNS que têm autonomia organizativa e de funcionamento,
para cumprir um Plano de Ação ACORDADO com o Diretor Executivo do ACES, regendo-se por
um Regulamento Interno APROVADO pelo DE. Têm como sede de decisão o
Conselho Geral, mas as suas decisões têm que
estar enquadradas na lei e submetidas à apreciação da hierarquia
institucional (Diretor Executivo) e que a aprovação pelo
DE depende do interesse público, da lei https://dre.pt/home/-/dre/107541409/details/maximized
e da equidade, cabendo ao Diretor Executivo zelar pela
conformidade do atrás referido dentro daquilo que são as suas competências
e os princípios éticos a que enquanto Dirigente de um Serviço Público se
encontra obrigado.
Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da
administração central, regional e local do Estado
Lei n.º 2/2004
Princípios gerais de ética
Os titulares dos cargos
dirigentes estão exclusivamente ao serviço do interesse público,
devendo observar, no desempenho das suas funções, os valores fundamentais e
princípios da atividade administrativa consagrados na Constituição e na lei,
designadamente os da legalidade, justiça e imparcialidade,
competência, responsabilidade, proporcionalidade, transparência e boa fé, por
forma a assegurar o respeito e confiança dos trabalhadores em funções públicas
e da sociedade na Administração Pública.
E tem nas suas competências
(DL ACES)
f) Avaliar o desempenho das
unidades funcionais e de serviços de apoio e responsabilizá-los pela utilização
dos meios postos à sua disposição e pela realização dos objetivos ordenados ou
acordados;
h) Gerir com rigor e
eficiência os recursos humanos, patrimoniais e tecnológicos afetos à sua
unidade orgânica, otimizando os meios e adotando medidas que permitam
simplificar e acelerar procedimentos e promover a aproximação à sociedade e a
outros serviços públicos;
j) Proceder ao controlo
efetivo da assiduidade, pontualidade e cumprimento do período normal de
trabalho por parte dos funcionários da sua unidade orgânica;
O Diretor Executivo e a
Validação dos Horários
Sobre horários e cargas horárias,
a lei define:
Artigo 22.º
Prestação do trabalho
1 - A forma de prestação de
trabalho dos elementos da equipa multiprofissional
consta do regulamento interno da USF e é estabelecida para toda a
equipa, tendo em conta o plano de ação, o período de funcionamento, a
cobertura assistencial e as modalidades de regime de trabalho previstas na lei.
(lembra-se o acima: artigo 10
nr 3 - Cada USF elabora o seu regulamento interno e submete-o ao centro de saúde, que aprecia da conformidade
do mesmo com o plano de ação previsto no artigo 6.º do presente
decreto-lei.
Artigo 23.º
Horário de trabalho
1 - O horário de trabalho a
praticar por cada elemento da equipa multiprofissional assim como o início e o
termo do período normal de trabalho deve ser definido em articulação e por
acordo entre todos os profissionais, de acordo com o previsto no n.º 1 do
artigo anterior.
2 - Nas USF modelo B, o
horário de trabalho deve ter como base as 35 horas com incrementos
ajustados às UC do suplemento associado às unidades ponderadas da lista de
utentes, previstas no artigo 30.º, 32.º e 34.º
3 - Os horários dos
profissionais são aprovados em conselho geral e submetidos pelo coordenador
a validação pelo diretor executivo do ACES.
A questão que se coloca é sobre a
interpretação do que significa, neste contexto "validação pelo Diretor
Executivo”:
- Se a validação
é meramente "notarial" limitando-se à
apreciação formal e burocrática: Conferir que houve Conselho Geral, que
houve ata, que a votação foi conforme, e que apresenta uma fundamentação
(seja ela qual for) sendo toda a responsabilidade da USF e decorrente da
sua total autonomia
- Ou se esta validação
é substantiva e está dependente da avaliação feita pelo DE : se
os horários estão de acordo com o , DL e adequados ao plano
de ação, período de funcionamento, a cobertura assistencial e as
modalidades de regime de trabalho previstas na lei.
Como vimos acima o Conselho
Geral de uma USF é um órgão da Administração Pública e tem de cumprir a Lei, donde
os seus horários e cargas horárias têm de estar de acordo com a Lei. Mas
compete ao Diretor Executivo do ACES a responsabilidade de o confirmar. Em
nenhum lado do DL das USFs se confere às USFs um estatuto de independência
(como o que resultaria de uma atitude de demissão do Diretor Executivo da
apreciação substantiva e se restringisse a uma mera apreciação formal do
processo decisório). Pelo contrário a lei faz questão de dizer que apesar da
autonomia para o desenvolvimento da sua atividade (o que é diferente de dizer
que são totalmente autónomas) são Unidades do Centro de Saúde (/ACES) . E
em nenhum lado se sugere que o Diretor Esecutivo se auto- restrinja
nas suas responsabilidades. Pelo contrário.
Ou seja, a meu ver, um DE tem que
fazer cumprir a Lei e quando valida os horários tem que verificar se eles
estão conforme a lei. E se não estiverem deve devolvê-los.
Não pode validar horários ilegais.
Assim, quando “Valida”
(legítima) horários desconformes com a Lei não está cumprir com os
princípios éticos acima referidos a que está obrigado e a responsabilidade
política e legal por horários ilegais e desadequados deixa de ser da
USF e passa a ser exclusivamente sua. A não ser que houvesse e algum
documento legal a dizer que a validação era apenas formal. Ora esse documento
não existe.
Passando agora da teoria para
a realidade
Começo com um absurdo para
explicar o meu ponto de vista.
Pode um DE aprovar horários de 20
h a médicos com 9 UCs de lista? : Não! Porque? Apenas porque não conforme com a
Lei.
Mas pode aprovar horários em
que a maioria dos médicos tem 3 tardes livres, incluindo o coordenador?
(como tem acontecido há vários anos) Também, pela mesma razão que não pode
aprovar horários de 20 h, não pode aprovar horários com 3 tardes livres
porque o DL obriga às modalidades de regime de trabalho previstas
na lei. E, pelo menos desde o ACT de 2009, todas as modalidades
de regime de trabalho contemplam 2 períodos de diários com intervalo
de almoço (exceto a jornada contínua a qual se restringe a situações muito
específicas)
Logo quando um Diretor
executivo aprova um horário com 3 tardes livres está a
legitimar uma ilegalidade. Pode ele apenas verificar os aspetos
formais da aprovação do horário e validá-lo ou deve devolvê-lo?
Ainda por cima porque isto
objetivamente prejudica o acesso dos utentes ao seu médico de família. Se
há coisas na Lei que lá estão apenas para defesa do interesse do
trabalhador mas que se este não se opuser ou até for do seu interesse
poderão não ser cumpridas (por exemplo o intervalo de almoço até um máximo
de duas horas, não havendo nada que objetivamente contra indique um
intervalo maior) já as 3 tardes livres prejudicam objetivamente o serviço aos
utentes.
Se a opção for que mesmo assim o
DE tem que validar, então isso tem que ficar claro até para o ilibar das
responsabilidades que lhe são acometidas por lei.
Se a opção for a de devolver
por não conforme com a Lei, então também tem que verificar a legalidade da
carga horária apresentada.
Passando para a carga horária
A lei define
Artigo 22.º
Prestação do trabalho
1 - A forma de prestação de
trabalho dos elementos da equipa multiprofissional consta do regulamento
interno da USF e é estabelecida para toda a equipa, tendo em conta o plano de
ação, o período de funcionamento, a cobertura assistencial e as modalidades de
regime de trabalho previstas na lei.
2 - Nas USF modelo B, o
horário de trabalho deve ter como base as 35 horas com incrementos ajustados às
UC do suplemento associado às unidades ponderadas da lista de utentes,
previstas no artigo 30.º, 32.º e 34.
Ou seja, a meu ver o DE tem
de verificar se as cargas horárias e os horários :
- Estão de acordo
com os regimes legais em vigor (o que neste momento é apenas tudo aquilo
que está no ACT e neste DL). Nota, a própria carta de compromisso
obriga (e bem) ao cumprimento do DL ao remeter para o cumprimento do
artigo 10 do DL das USFs
- Estão adequados ao
PA e Compromisso Assistencial (e este tem que estar de acordo com a dimensão
ponderada da lista) - Nota: artigo 10 nr. 3 - Cada USF elabora o
seu regulamento interno e submete-o ao centro de saúde, que aprecia da
conformidade do mesmo com o plano de ação previsto no artigo 6.º do
presente decreto-lei.
- Têm os incrementos ajustados às
UC de lista
Ora sobre a carga horária
- Este DL no fundo o que faz é permitir que quem tem
menos UCs de lista (0 por exemplo) não tenha que fazer as 40 h do regime
geral da carreira médica e por outro lado possibilita que se façam mais de
40 h.
- Quando fala de incrementos ajustados não fala que
quem tem 9 UCs tem que ter 9 incrementos e depois o valor de cada
incremento pode ser o que cada um quiser. Essa foi uma interpretação posta
a correr mas que é falaciosa e que distorce o preconizado
na Lei - que a carga horária deve ser ajustada ao aumento
de UCs (no limite + 9 horas para quem tem 9 UCs de lista embora se aceite
que o "ajuste" não tem que ser absolutamente coincidente,
havendo alguma margem de manobra, sobretudo na forma de o justificar- por
exemplo 2 h de isenção de horário que parece ser o adequado à
especificidade dos compromisso assumidos ).
- É legal fazer menos de 40 horas para quem tem 9 UCs
de Lista (ou seja, as mesmas unidades ponderadas de que no regime geral
tem que fazer 40 h)?
Em relação ao ponto 3
Eu creio que não é
legal porque atentatório do princípio constitucional "trabalho igual
salário igual". Ou seja, sendo as UCs exclusivamente remuneração do
aumento de lista, se quem tem as mesmas 2358 UPs que os colegas no regime
geral fizer menos do que as 40 h que fazem os colegas no regime geral
(uscps e modelo A) está a valorizar o seu valor hora sem que exista qualquer
critério que o fundamente provocando uma inconstitucional desigualdade.
***************************************
Sobe o princípio
constitucional "trabalho igual salário igual"
Ver Acordão
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b2a2dfe5caef40468025808a0036de43
III 1 – Resulta do artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição
da República, sob a epígrafe, «direitos dos trabalhadores», que «todos os
trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de
origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito»: «a) à
retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade,
observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma
a garantir uma existência condigna». Este dispositivo projeta ao nível da fixação da
retribuição do trabalho, como base para garantir uma existência condigna, o
princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Lei Fundamental, nos
termos do qual, «todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais
perante a lei» e «ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado,
privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de
ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções
políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou
orientação sexual». De acordo com GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, o
âmbito de proteção desta norma «abrange na ordem constitucional portuguesa as
seguintes dimensões: a) proibição do arbítrio, sendo
inadmissíveis, quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação
razoável, de acordo com critérios de valor objetivos, constitucionalmente
relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente
desiguais; b) proibição de discriminação, não sendo legítimas
quaisquer diferenciações de tratamento entre cidadãos baseadas em categorias
meramente subjetivas ou em razão dessas categorias (cfr. n.º 2 onde se faz
expressa menção de categorias subjetivas que historicamente fundamentaram
discriminações); c) obrigação de diferenciação, como forma de
compensar a desigualdade de oportunidades (…)»[2]. A projeção do princípio da igualdade na retribuição
do trabalho, na alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da Lei Fundamental,
«estabelece os princípios fundamentais a que deve obedecer o direito
a uma justa retribuição do trabalho: (a) deve ser conforme à
quantidade do trabalho (i. e, à sua duração e intensidade), à natureza do
trabalho (i. e, tendo em conta a sua dificuldade, penosidade ou perigosidade)
e à qualidade do trabalho (i. e, de acordo com as exigências em
conhecimentos, prática e capacidade); (b) a trabalho igual em
quantidade, natureza e qualidade deve corresponder salário igual,
proibindo-se, desde logo, as discriminações entre trabalhadores; (…)»[3]. O princípio da igualdade, na sua dimensão
remuneratória, como refere MARIA DO ROSÁRIO DA PALMA RAMALHO, «não impede
diferenças remuneratórias entre trabalhadores mas apenas um tratamento
remuneratório discriminatório. Por outras palavras, apenas estão aqui
contempladas as situações em que, perante um trabalho igual ou de valor
igual, a retribuição seja diferente sem uma causa de justificação objetiva»[4]. Na síntese do acórdão desta Secção de 22 de abril
de 2009, proferido no processo n.º 3040/08[5],
«o que decorre do princípio para trabalho igual salário igual é a igualdade
de retribuição para trabalho igual em natureza, quantidade e qualidade, e a
proibição de diferenciação arbitrária (sem qualquer motivo objetivo) ou com
base em categorias tidas como fatores de discriminação (sexo, raça, idade e outras)
destituídas de fundamento material atendível, proibição que não contempla,
naturalmente, a diferente remuneração de trabalhadores da mesma categoria
profissional, na mesma empresa, quando a natureza, a qualidade e quantidade
do trabalho não sejam equivalentes, atendendo, designadamente, ao zelo,
eficiência e produtividade dos trabalhadores em causa». E prossegue-se naquele acórdão, referindo que
«nesta linha de orientação, este Supremo Tribunal, chamado a dirimir litígios
em que não se mostrava invocado qualquer dos fatores característicos de
discriminação, tem entendido, em termos uniformes, que para se concluir pela
existência de discriminação retributiva entre trabalhadores, ofensiva dos
princípios constitucionais da igualdade e de trabalho igual, salário igual, é
necessário provar que os vários trabalhadores diferentemente remunerados
produzem trabalho igual quanto à natureza (dificuldade, penosidade e
perigosidade), qualidade (responsabilização, exigência, técnica,
conhecimento, capacidade, prática, experiência, etc.) e quantidade (duração e
intensidade), competindo o ónus da prova ao trabalhador que se diz
discriminado - Acórdãos de 6 de fevereiro de 2002 (Processo n.º 1441/2001,
sumariado em www.stj.pt/Jurisprudência/Sumários de Acórdãos/Secção Social),
de 9 de novembro de 2005, de 23 de novembro de 2005 e de 25 de junho de 2008
(respetivamente, Documentos n.ºs SJ200511090013804, SJ200511230022624 e
SJ200806250005284, em www.dgsi.pt)». |
***********************************+
Em resumo : As USFs são Unidades
do SNS, integrantes do Centro de Saúde (ACES) , sujeitas à hierarquia, contudo
com plena autonomia organizacional, para, dentro do Enquadramento Legal ,
cumprirem com um Plano de Acção acordado, de acordo com o Seu Regulamento Interno
"aprovado na conformidade verificada com o Plano de
Acção", cabendo ao DE verificar do cumprimento do referido
Enquadramento Legal, não podendo, a meu ver, validar Horários e Cargas Horárias
não conformes com a Lei, sobretudo nos aspetos em que prejudica os utentes.
A partir da altura em que o
Diretor Executivo valida (legitima) os Horários a responsabilidade
política e legal passa, a meu ver, a ser exclusivamente dele.
O Coordenador da Reforma enviou
uma proposta que representa a visão institucional e política para os
coordenadores das USFs e também para os DE que são a outra
parte. A que valida. Não pode ser mais que uma proposta porque tem de respeitar
a autonomia da USF e a autonomia dos Diretores Executivos. A
responsabilidade de aprovar horários é do Conselho Geral da USF e a da Validar
é do DE. Se os interesses pessoais dos profissionais os levarem a não aceitar
aquela "proposta", nada impede que o DE não a tenha em consideração e
se guie por ela no momento de validar ou não os horários. Parece-me que seria
útil os DE fazerem saber se o pretendem fazer o ou não.
Para os profissionais das USFs
que referem bastarem as 35 h e não serem precisas as 9 horas pagas pelo aumento
de lista porque cumprem com o TMRG (o
mesmo a que estão obrigados as UCSPs- estranho como nesta área crucial as USFs
do Modelo B não pretendam fazer melhor que as UCSPs quando estas ainda atendem
doentes sem médico) lembro que então um dia alguém se irá lembrar de
deixar de pagar essas horas ou impor o atendimento aos sem médico a que estão sujeitos os
profissionais das UCSPs que têm que fazer 40 h.
Poderá haver outra visão e outra
leitura da Lei. Mas se existir ela deve ser manifestada e fundamentada.
Sobretudo se oficial.
3.7 O Relatório Escondido e O
Despacho da Confusão e da Cobardia Política
Confesso que não tencionava
voltar a este tema. Contudo, há uma semana, despois de meses de gestação após o
relatório da IGAS sobre as Auditorias Realizadas nas várias ARS relativamente
aos horários das USFs Modelo B (Auditorias e Relatório que se mantêm secretos,
guardados a sete chaves), saiu finalmente o despacho da clarificação do DL das
USFs referente às cargas horárias.
Surpresa das surpresas. Depois de
reconhecer, e bem, a grande confusão sobre este tema
A definição dos horários de
trabalho nas USF modelo B tem suscitado dúvidas entre as
Administrações Regionais de Saúde, I. P. (ARS, I. P.), conduzindo a diversas
interpretações e diferentes práticas nas USF modelo B, em especial no que
respeita à conversão das UC em horas efetivas de trabalho e definição do limite
máximo de horas semanais a prestar pelos vários profissionais.
Afigura -se, portanto,
essencial definir procedimento homogéneo que clarifique os critérios a
considerar no ajustamento dos horários das USF modelo B às características da
lista de utentes, na contabilização do incremento, bem como que clarifique a
competência do Conselho Geral da USF modelo B na aprovação dos horários e do
diretor executivo do respetivo ACES que procede à validação, face ao plano de
ação, ao período de funcionamento e ao compromisso assistencial.
aquilo que está no despacho é o
detalhe de tudo o que é processual e formalidades a cumprir mas nada diz ou
esclarece sobre o essencial e que é a causa de USF modelo B tem suscitado
dúvidas entre as Administrações Regionais de Saúde, I. P. (ARS, I. P.),
conduzindo a diversas interpretações e diferentes práticas nas USF modelo B, em
especial no que respeita à conversão das UC em horas efetivas de trabalho e
definição do limite máximo de horas semanais a prestar pelos vários
profissionais.
De facto em 7 pontos muito claros define todo o processo: estipula prazos, reunião do conselho geral
para definir e justificar os incrementos e aprovar os horários, refere o envio
da ata para Direção Executiva do ACES e que esta envia a ata validada por
si para o CD da ARS respetiva que
monitorizará, publicará no site da ARS e enviará à Tutela Politica.
Contudo falta o ponto fulcral : Porque critérios se guia o Diretor
Executivo do ACES para validar os incrementos e horários aprovados pelo
Concelho Geral da USF? Onde está nesse
despacho o procedimento homogéneo que clarifique os critérios a considerar
no ajustamento dos horários das USF modelo B às características da lista de
utentes, na contabilização do incremento, que era o objeto deste
despacho?
Na verdade, falta o ponto em que diz que o DE recebe a ata, aprecia a
justificação e valida os incrementos e horários depois de verificar que… (os mesmos estão de acordo com a lei e com os
princípios enunciados no ponto um, digo eu)
E nos princípios enunciados no ponto 1 encontra-se a g) O rácio de unidades ponderadas por
profissional, referente ao número de utentes inscritos em 31 de dezembro do ano
anterior. O que nos remete para o nr 2 do artigo 23 e para os
incrementos ajustados as UCs.
O que era fundamental fazer era
esclarecer politicamente, de uma vez por todas, como se interpreta este artigo
antes que tenha que ser o Tribunal de Contas a esclarecê-lo. Isto, era o que
devia estar despacho para responder ao preambulo e a razão de ser deste
despacho.
23.º
Horário de trabalho
1 - O horário de trabalho a
praticar por cada elemento da equipa multiprofissional assim como o início e o
termo do período normal de trabalho deve ser definido em articulação e por
acordo entre todos os profissionais, de acordo com o previsto no n.º 1 do
artigo anterior.
2 - Nas USF modelo B, o horário de trabalho deve ter como base as 35 horas
com incrementos ajustados às UC do suplemento associado às unidades
ponderadas da lista de utentes, previstas no artigo 30.º, 32.º e 34.º
3 - Os horários dos profissionais são aprovados em conselho geral e submetidos
pelo coordenador a validação pelo diretor executivo do ACES.
A meu ver, e era isto que era
importante estar neste despacho, e não está (é omisso), na apreciação da
validade um DE terá, para além da apreciação (subjetiva) da adequação do que é
a proposta aprovada pelo CG a a) O
plano de ação; b) O período de funcionamento da USF de modelo B; c) As
necessidades próprias para o cumprimento do compromisso assistencial; d) A
cobertura assistencial; e) Os objetivos da Carta de Compromisso ajustados à
dimensão máxima de lista de utentes; que ter em ainda em conta a legalidade (que é
objetiva) .
Assim : O ajuste incremental de
tempo deve ser da mesma natureza de grandeza do ajuste remuneratório ( Unidades
de Contratualização devidas ao aumento
ponderado da lista). Deve pois corresponder aproximadamente ao número de
Unidades de Contratualização pagas , tendo já sido esclarecido que o valor de
uma UC corresponde ao pagamento de uma Hora Extra (e até é de valor
superior).
Por outro lado os Médicos que
tenham 9 UCs de lista não deverão poder legalmente fazer menos de 40 h por
semana que é o Regime Geral em vigor no ACT da Carreira de MGF e a que
correspondem precisamente listas de 2356 UPs
(9 UCs) e devem cumprir , de um
modo geral, com os princípios de organização do horário definidos no ACT para a
Carreira de MGF, que apontam para dois períodos por dia.
Artigo 22.º
Prestação do trabalho
1 - A forma de prestação de
trabalho dos elementos da equipa multiprofissional consta do regulamento
interno da USF e é estabelecida para toda a equipa, tendo em conta o plano de
acção, o período de funcionamento, a cobertura assistencial e as modalidades
de regime de trabalho previstas na lei.
ACT
C) Tempo de trabalho
Cláusula 33.ª
Período normal de trabalho
1 — O período normal de
trabalho é de oito horas diárias e quarenta horas semanais, organizadas
de segunda a sexta -feira, sem prejuízo dos números seguintes
2 — O trabalho em serviços de
urgência, externa e interna, unidades de cuidados intensivos, unidades de
cuidados intermédios e prolongamentos de horário nos centros de saúde é
organizado de segunda -feira a domingo.
3 — Os trabalhadores médicos não
podem realizar, em média, mais de 48 horas por semana, incluindo trabalho
suplementar, num período de referência de 6 meses.
4 — Sem prejuízo da
organização do horário de trabalho na modalidade de horário flexível, entende
-se, para efeitos de cômputo do tempo de trabalho, que a semana de trabalho tem
início às zero horas de segunda -feira e termina às 24 horas do domingo seguinte.
5 — A entidade empregadora
pública deve manter um registo que permita apurar o número de horas de trabalho
prestadas pelo trabalhador, por dia e por semana, com indicação das horas de
início e de termo do trabalho.
Cláusula 34.ª Horário de trabalho
1 — Cabe à entidade empregadora pública a
determinação das horas de início e termo do período normal de trabalho diário,
bem como dos intervalos de descanso, precedido de consulta do trabalhador
médico.
2 — Os horários de trabalho são organizados,
nomeadamente segundo um dos seguintes tipos: a) Horário fixo; b) Horário
flexível; c) Horário desfasado; d) Jornada continua; e) Isenção de horário.
3 — As regras específicas de
cada tipo de horário não são observadas sempre que se mostrem pontualmente
inconvenientes para o trabalho prestado em serviço de urgência, cirurgias e
situações análogas.
Então porque é que sai este
despacho? Porque depois dos resultados das Auditorias e subsequente Relatório
da IGEAS o Governo precisava de fazer alguma coisa. E assim fez este despacho
em que, para não levantar animosidades em tempo de eleições, não esclarece
coisa nenhuma deixando, cobardemente, para cada um dos Diretores Executivos a
responsabilidade de validar; e sem Critério Orientador para interpretar uma Lei
ambígua feita pelo Governo. E isto sabendo que o Tribunal de Contas tem o
assunto em estudo e que pode determinar sanções pecuniárias pesadas para quem
aprova ou valida situações que ele considere ilegais.
Ps Por mim eu trocava esta
questão das cargas horárias pela obrigação do cumprimento de um TMRG para
consultas programadas de 5 dias úteis.
Pelo despacho publicado em 21/6 as Unidades de Saúde Familiar (USFs)
tiverem 3 semanas (até 12 de Julho) para fazerem os Conselhos Gerais (CGs),
aprovarem os Horários e enviarem as atas dos CGS para os Diretores Executivos
(DEs) dos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES).
As ARS deveriam ter publicado nos seus sites até 31 de Julho os relatórios
de monitorização das USF modelo B, contendo as atas dos GCs e as respetivas
validações pelos diretores executivo do ACES. Passou Agosto, passaram 3 semanas
de Setembro e finalmente saiu o Relatório da ARS Centro.
3
- Os horários dos profissionais e o valor
do incremento da carga horária aprovados em Conselho Geral, nos termos do n.º
1, bem como a respetiva fundamentação, constam de ata a submeter pelo
coordenador da USF modelo B à validação pelo diretor executivo do ACES.
4 - A
Administração Regional de Saúde, I. P. (ARS, I. P.), territorialmente
competente acompanha e monitoriza a aplicação das regras e princípios
constantes do Decreto-Lei n.º 298/2007, de 22 de agosto, em matéria de horário
de trabalho e procede às auditorias que se mostrem adequadas junto das USF
modelo B.
5 -
Cada ARS, I. P., até final do 1.º quadrimestre civil, remete à tutela cópia do relatório
de monitorização por USF modelo B, contendo a ata e a respetiva validação do diretor executivo do ACES,
disponibilizando-o, simultaneamente, em formato digital no seu sítio da
Internet
6 - As USF modelo B que, em 2019,
não tenham ainda dado cumprimento às obrigações previstas nos n.os 1 a 3, devem
fazê-lo até 15 dias úteis após a publicação do despacho, devendo as ARS cumprir o disposto no número anterior até ao final do
mês seguinte à publicação do despacho.
Passados 2 meses sobre os 15 dias dados no despacho às ARSs para publicarem
(31 de Julho) , nas outras ARSs continua sem nada se saber. E os quinze dias
seriam mais que suficientes para aquilo que no despacho se pede: A
publicação nos sites das ARSs das Atas dos Concelhos Gerais que aprovaram os
horários e os despachos dos Diretores Executivos validando ou não os horários
dos profissionais constantes nas Atas.
Das duas uma: ou as ARSs são relapsas e muito incompetentes ou estão a
fazer gestão política aguardando a passagem das eleições e subtraindo ao
escrutínio público esta questão. Ambas as hipóteses são muito graves.
As ARS são organismos da Administração e devem ser independentes do Poder
Político embora subordinadas a ele. Ou seja, devem cumprir com as Leis e
Despachos produzidos pelo Poder Político, mas não devem atender a orientações
contrárias sopradas pelos gabinetes.
Lembra-se
que este Despacho decorre do resultado das auditorias
anunciadas em primeira mão pelo Saudeonline que terão revelado que aquilo que aqui
se disse era verdade.
O
Relatório da ARS Centro
O Relatório da ARS Centro
não só não cumpre com parte do que é
ordenado no Despacho ao omitir a publicação dos horários aprovados (porque o
faz?) como tem um preambulo que faz o
enquadramento jurídico da determinação das cargas horárias do Modelo B, onde se
exprimem apenas duas conclusões jurídicas, as quais, a meu ver, estão ambas
profundamente erradas, subvertem o que o legislador diz e terão consequências
negativas no Modelo B.
Diz o Relatório
Assim, a primeira conclusão a retirar da
norma transcrita é a obrigatoriedade da carga horária dos profissionais
das USF-B ser superior à base definida, que é de 35 horas semanais, quando
o profissional tenha optado por ter acréscimos de unidades ponderadas superior
às 1917 UP (médicos e enfermeiros) ou 2474 UP (secretários clínicos),
mínimos definidos nos artigos 9º, 32ª e 34º do Decreto-Lei n.º 298/2007 de 22
de agosto, alterado e republicado pelo Decreto-Lei nº 73/2017 de 21 de junho.
A segunda conclusão, e última, é que não
cabe ao ACES definir a carga horária e sua distribuição, mas sim aos CG das
USF-B, de forma fundamentada, tendo em consideração o plano de ação da USF, o
período de funcionamento, as necessidades próprias para o cumprimento do compromisso
assistencial, os objetivos da Carta de Compromisso, a avaliação do desempenho
em todas as áreas, subáreas e dimensões, nomeadamente no cumprimento dos TMRG, onde
se inclui a resposta a doença aguda no próprio dia e o rácio de unidades
ponderadas por profissional, referente ao número de utentes inscritos em 31 de
dezembro do ano anterior.
Assim para a ARS Centro, para quem tem UCs
por aumento da lista de utentes, basta 1 minuto a mais para que, desde que se
tenha feito justificação, do ponto de vista jurídico tudo possa estar correto.
Ora a meu ver a ARSC neste relatório
ignora vários artigos do DL das USFs
: os que referem que as USFs têm que cumprir o DL, que os horários têm que
estar de acordo com o regime jurídico das respetivas carreiras profissionais
(sendo que atualmente só existe o das 40 hs/2358 UPs), com as modalidades de regime de trabalho
existentes na lei, e com o ajuste horário de acordo com o ajuste
remuneratório das Unidades de Contratualização (UCs) por aumento de
ponderado da lista
Ignora ainda que o DL atribui aos
Diretores Executivos a responsabilidade de validar ou não as decisões dos CGs
das USFs nesta matéria. Que, se, como bem diz, cabe aos CGs aprovarem os
horários, esquece que os Diretores Executivos têm a obrigação e dever de os
apreciar e verificar se estão de acordo com o DL das USFs. Ou seja se estão de
acordo com o que a seguir se refere (ver os artigos que se transcrevem abaixo e
os sublinhados a bold ):
A meu ver, para quem tem 9 UCs de
lista (2358 Ups) terá que
ter uma carga horária mínima de 40 h pois é o Regime definido em 2012 para
a MGF : 40hs /2358 Ups
Por outro lado, e tendo sido esclarecido
pela Coordenação Nacional da Reforma do SNS- CSPs que o pagamento de 1 UC
correspondia ao pagamento de 1 h suplementar não restam dúvidas que a natureza
do ajuste do incremento horário deve ser da mesma natureza do ajuste das UCs de
lista pagas. Aliás, como se vê no artigo 28 do DL, o legislador claramente
distingue o que é suplemento remuneratório do que é compensação pelo desempenho
(como o são as UCs da Atividades Específicas) e atribui às UCs de lista a
categoria de suplemento remuneratório.
Considerando que o trabalho remunerado
(seguimento de uma lista de 2358 UPs) para quem tem 9 UCs de lista é o
mesmíssimo trabalho de quem está em 40 Hs, em Modelo A ou UCSP; ao se
aceitar, como o faz a avaliação jurídica deste relatório, que não é como
acima digo e que basta o incremento de 5 ms (ou menos desde que maior que 0)
por UC e que cabe ao CG livremente determinar o valor do incremento, sem
consideração pela dimensão do ajuste remuneratório pelo aumento de lista (UCs
de lista), não só se incorre no incumprimento do estipulado no DL como acima se
explicou, defraudando os contribuintes quer na remuneração que se paga pelas
9 UCs de lista (1790 Euros/mês, 14 meses- no caso dos Médicos), sem
contrapartida , quer na legítima expectativa de uma melhor acessibilidade.
Incorre ainda a Administração, e
através dela o Estado, na prática de para uma mesma tarefa e para a mesma
diferenciação técnica se remunerar de uma forma muito diferente
(escandalosamente diferente) trabalho igual. Fugindo ao preceito
Constitucional “trabalho igual salário
igual”
Finalmente importa dizer
que apesar do que acima se escreve, e de todas as USFs B da Região Centro terem
visto as atas validadas pelos Diretores Executivos dos respetivos ACES, cerca
de 80% das USFs irão ser auditadas; só não se saba quais os critérios das
auditorias e quais consequências.
Para mim, esta suposta e
irregular “independência” concedida às USFs foi o dar corda para o fim do
Modelo B de que verdadeiramente a Administração e as Finanças nunca gostaram.
Desde logo inventaram a necessidade de estagiarem em Modelo A para as USFs
ganharem “consistência e maturidade” e depois inventaram as quotas anuais.
Tivessem os Modelos Bs ajustado a sério as suas cargas horárias às UCs de lista
pagas e poderiam ter uma acessibilidade muito melhor que em Modelo A e UCSP e
seriam, a bem dos utentes, imparáveis e irrecusáveis. Terem uma mesma exigência
de Tempo de Resposta Máxima Garantida (TMRG) que a mais humilde e desfalcada
UCSP foi outra das armadilhas.
Assim um relatório não
divulgado (como o não foram as auditorias realizadas no ano passado em todas as
ARSs aos Horários das USFs B aprovados
nem o relatório da IGAS sobre as mesmas, o que diz bem da transparência do SNS
e da Administração) supostamente diz que o Modelo B já não é custo efetivo e em
consequência as 20 USFs de Modelo a previstas para passarem em 1 de
Outubro, hoje, já não irão passar.
António Costa fala na
generalização do Modelo USF mas não fala em Modelos Bs…
O Modelo B acabou. Deram
cabo dele.
Legislação evocada
Artigo 59.º
(Direitos dos trabalhadores)
1. Todos os trabalhadores, sem distinção
de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções
políticas ou ideológicas, têm direito:
a) À retribuição do trabalho, segundo a
quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para
trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência
condigna;
Princípio aliás transcrito para o Código
do Trabalho
Artigo
31.º
Igualdade
de condições de trabalho
1 – Os trabalhadores
têm direito à igualdade de condições de trabalho, em particular quanto à
retribuição, devendo os elementos que a determinam não conter qualquer
discriminação fundada no sexo.
2 – A igualdade de
retribuição implica que, para trabalho igual ou de valor igual:
a) Qualquer modalidade
de retribuição variável, nomeadamente a paga à tarefa, seja
estabelecida na base da mesma unidade de medida;
b) A retribuição
calculada em função do tempo de trabalho seja a mesma
Seguem os artigos do DL ignorados no
referido enquadramento jurídico do Relatório da ARSC:
Artigo 10.º
Organização e funcionamento da USF
1 - A organização e funcionamento da USF
constam do seu regulamento interno e regem-se pelo disposto no presente
decreto-lei.
Artigo
21.º
Disposição geral
1 - O regime de prestação de trabalho é o previsto
no regime jurídico das respetivas carreiras profissionais, no
regime jurídico do contrato individual de trabalho e no presente
decreto-lei, sem prejuízo das regras adotadas por acordo expresso dos
elementos da equipa multiprofissional nos casos legalmente possíveis.
4 - O incumprimento do disposto nos
números anteriores é objeto de comunicação à Inspeção-Geral das Atividades em
Saúde para os devidos efeitos.
E o
único regime actual da carreira medica são 40h/2358 Us (9 UCs) -
Artigo
22.º
Prestação do trabalho
1 - A forma de prestação de trabalho dos elementos da
equipa multiprofissional consta do regulamento interno da USF e é estabelecida
para toda a equipa, tendo em conta o plano de ação, o período de funcionamento,
a cobertura assistencial e as modalidades de regime de trabalho previstas na
lei.
Artigo 23.º
Horário de trabalho
1 - O horário de trabalho a praticar por cada elemento
da equipa multiprofissional assim como o início e o termo do período normal de
trabalho deve ser definido em articulação e por acordo entre todos os
profissionais, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo anterior.
2 - Nas USF modelo B, o horário de trabalho deve ter
como base as 35 horas com incrementos ajustados às UC do suplemento associado às unidades
ponderadas da lista de utentes, previstas no artigo 30.º, 32.º e 34.º
3 - Os horários dos profissionais são aprovados em conselho geral e submetidos
pelo coordenador a validação pelo diretor executivo do ACES.
Artigo 28.º
Remuneração dos médicos
1 - A remuneração mensal dos médicos das
USF integra uma remuneração base, suplementos e compensações pelo
desempenho.
2 - A remuneração base corresponde à
remuneração da respetiva categoria e escalão, em regime de trabalho de
dedicação exclusiva e horário de trinta e cinco horas semanais, relativa à
responsabilidade pela prestação de cuidados de saúde aos utentes da respetiva
lista, com a dimensão mínima prevista no n.º 3 do artigo 9.º do presente
decreto-lei.
3 - São considerados os seguintes
suplementos:
a) O suplemento associado ao aumento
das unidades ponderadas, nos termos do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 9.º;
b) O suplemento da realização de
cuidados domiciliários;
c) O suplemento associado às unidades
contratualizadas do alargamento do período de funcionamento ou cobertura
assistencial, nos termos do disposto nas alíneas b) e c) do n.º 5 do artigo
10.º, quando contratualizado.
4 - A compensação pelo desempenho
integra:
a) A compensação associada ao
desenvolvimento das atividades específicas, previsto no artigo 29.º;
b) A compensação associada à carteira
adicional de serviços, nos termos do disposto no n.º 6 do artigo 6.º, quando
contratualizada.
5 - As componentes previstas nas alíneas
a) e b) do n.º 3 do presente artigo são devidas e pagas integral e mensalmente
ao médico.
6 - As componentes previstas na alínea
c) do n.º 3 e na alínea a) do n.º 4, ambas do presente artigo, são devidas ao
grupo de médicos, divididas igualmente por todos, sendo paga, mensalmente, a
cada médico, a respetiva quota-parte.
7 - As componentes previstas na alínea
c) do n.º 3 e na alínea a) do n.º 4 são consideradas para efeitos de
aposentação ou reforma e para efeitos de abono de vencimento de exercício
perdido em virtude de faltas por doença ou de proteção social na eventualidade
doença.
8 - A remuneração referida neste artigo
implica o pagamento de subsídios de férias e de Natal nos termos da lei.
3.9 Análise ao escandaloso relatório da ARS Norte
Num
país civilizado este relatório implicaria a imediata demissão do Presidente da
ARS Norte.
Este relatório aparece
2 meses e meio após o prazo de 15 dias, previsto no Despacho 5803/2019, de 21 de junho, que terminava em 31 de Julho. Aparece 8 dias
após as eleições. O trabalho apresentado demoraria no máximo uma semana a ser
feito. Donde se pode concluir que a Administração não cumpriu o determinado no
despacho e fez gestão política escamoteando esta questão ao debate público.
O relatório também não cumpre o determinado no
despacho ao não apresentar as atas dos Conselhos Gerais das Unidades de Saúde
Familiar (USFs) com os horários por ele aprovados conforme claramente decorre
do que determina o despacho nos seus pontos 3 e 5.
3 - Os
horários dos profissionais e o valor do incremento da carga horária
aprovados em Conselho Geral, nos termos do n.º 1, bem como a respetiva
fundamentação, constam de ata a submeter pelo coordenador da USF
modelo B à validação pelo diretor executivo do ACES
5 - Cada ARS, I. P., até final do 1.º quadrimestre civil, remete à tutela cópia
do relatório de monitorização por USF modelo B, contendo a ata e
a respetiva validação do diretor executivo do ACES, disponibilizando-o, simultaneamente, em formato digital no seu sítio da
Internet
Na apresentação
dos dados é manifesta a opção pela opacidade, pelo esconder, em vez da opção
pela clareza e pelo mostrar como era manifestamente o propósito do despacho.
Assim, além de não publicar as atas e os horários
(independentemente dos incrementos e da carga horária, a própria
estruturação dos horários é importante, até porque persiste a acusação de que
existem médicos com três tardes por semana sem atividade assistencial, o que
não só é lesivo dos direitos dos utentes, como não se enquadra em nenhum regime
de trabalho conforme o DL obriga) o relatório apresenta sempre os dados pela
totalidade da USF e não por profissional, nem sequer apresenta as médias das
Unidades Ponderadas e das Unidades de Contratualização (UCs) de aumento de lista por profissional. Os
incrementos são numas USFs apresentados como incrementos por UC e noutras como
incremento por tempo total, quanto tudo poderia ter sido reduzido facilmente a
Incremento por UC. Não sendo o quadro de dados fornecido em tabela de exccel
trabalhável, desanima à partida quem quiser perceber o que lá está.
Na Análise que o Relatório faz apresenta os dados por
ACES, em vez de apresentar os dados por USF, como seria suposto uma vez
que o tema deste relatório é analise de cada USF. Dos dados agregados por
ACES nada se consegue extrair nem qualquer conclusão tirar.
No enquadramento legal que se faz no Relatório sobre a
questão dos horários e cargas horárias comete-se o mesmo erro do Relatório da
ARS Centro ao se esquecer o nr. 1 do artigo 21 que remete para o regime
jurídico das respetivas carreiras profissionais, ignorando
que o atual regime da carreira médica é 40 horas/2358 Ups (= 9 UCs) - das 144
USFs B da Região Norte apenas uma tem uma carga horária de 40
h!- e o nr.1 do artigo 22 que remete para as
modalidades de trabalho previstas na lei , reduzindo
tudo ao nr. 2 do artigo 23.
2 - Nas USF modelo B, o horário de
trabalho deve ter como base as 35 horas com incrementos ajustados às UC do
suplemento associado às unidades ponderadas da lista de utentes, previstas no
artigo 30.º, 32.º e 34.º
e sem fazer qualquer valor interpretativo sobre a
dimensão do ajuste. Lembra-se, que um parecer jurídico publicado na
Revista do SIM reconhece como bom o princípio das 40 horas para quem tem 9 UCs
de lista pela equiparação com o regime atual da carreira
médica "deixando o regime de prestação de trabalho de origem
enquanto ali estiverem integrados, apenas poderão ter aquele que atualmente o
paradigma do SNS (40 horas) ... É importante realçar que, uma vez
que algumas ARS pretendem que os médicos apresentem horários para
a prestação de trabalho de 35 horas semanais em USF de modelo B, embora
conflituando com o entendimento acima avançado, na medida em que constitui um
benefício em prol dos médicos, poderão assim estes praticar tais
horários".
E que o mesmo SIM, num comunicado de 25 de Julho
de 2018, diz expressamente: "Assim, às 9 UC corresponderão no máximo 5
horas de trabalho, pelo que 1 UC corresponderá, no máximo a 33,3 minutos". e
apresenta uma tabela tendo como base os 33,3 minutos por UC.
De facto, como as UCs de lista no DL não aparecem como
incentivo ou prémio de desempenho mas como suplemento remuneratório por tempo,
o não se cumprir isto põe em causa o princípio constitucional de trabalho igual
salário igual.
E se o relatório reconhece "Os
profissionais, embora tenham uma remuneração suplementar para a gestão da lista
de utentes, superior ao definido pelo preço de 1h extra, propõem-se
realizar, em média, ¼ dessa hora". ou seja que cada UC que é
paga tem um valor superior de uma Hora Suplementar e que na grande maioria das
USFs o ajuste por UC é apenas de 15 minutos (ou menos) - o que representa
um evidente defraudar dos contribuintes e dos direitos dos utentes- é espantosa
a conclusão branqueadora "Globalmente e em elevada percentagem as
USF cumpriram o determinado no n.º 2 do artigo 23.º do Decreto-Lei 73/2017, de
21 de junho"
Esta conclusão congratulatória está de facto em
linha com a instrução dada referida no anexo I “Nota: Foi solicitado
aos Diretores Executivos que validassem as atas desde que elas definissem um
incremento fundamentado”.
Ou seja, a ARS Norte assume que apenas é necessário 1
minuto de incremento por UC de aumento de lista (apesar de reconhecer que paga
mais de 1 hora suplementar por cada UC). E assim, todos os horários
apresentados com 2,5 minutos por incremento (o valor mais pequeno apresentado)
foram validados pelos Diretores Executivos. Só as atas dos CGs das USFs que não
apresentaram qualquer incremento é que não foram validados.
No Relatório
Conclusões
Globalmente e em elevada percentagem as USF cumpriram
o determinado no n.º 2 do artigo 23.º do Decreto-Lei 73/2017, de 21 de junho.
Mais de metade das USF da região não precisaram do reforço da Senhora
Secretária de Estado da Saúde para implementarem o ajuste do seu tempo de
trabalho à respetiva lista de utentes.
Da leitura das atas, verifica-se uma fundamentação
genérica da proposta de incremento, enumerando os critérios de análise para a
sua definição, tal como constam do Despacho 5308/2019, mas sem caracterizar de
que forma cada critério contribuiu para aquela definição. Por exemplo,
nenhuma equipa analisou o tempo efetivo de trabalho no ano anterior, nem fez
uma análise crítica sobre o que ficou por fazer.
Existe uma assimetria regional considerável quanto aos
incrementos estabelecidos, que se mantém presente em cada ACeS e até, por
vezes, na própria equipa que atribui valores de tempo diferente aos incrementos
para as áreas profissionais, sem uma fundamentação clara dessa decisão. Chegam
até a atribuir valores diferentes na mesma área profissional e para UC iguais.
Há equipas a atribuir os incrementos a atividades não
assistenciais ou a definirem em ata que podem ser cumpridos sem presença dos
profissionais.
Os profissionais, embora tenham uma
remuneração suplementar para a gestão da lista de utentes, superior ao definido
pelo preço de 1h extra, propõem-se realizar, em média, ¼ dessa hora.
Palavras para quê?
Em relação às
propostas é espantosa a passividade da ARS Norte. Enquanto a ARS
Centro anuncia que cerca de 80% das USFs do modelo B irão ser auditadas,
aliás de acordo com o previsto no despacho, no relatório da ARS Norte nada
consta. Pelos vistos a ARS Norte considera estar
tudo bem, mesmo naquelas USFs que não apresentaram incrementos ou que nem
sequer apresentaram as atas.
Este relatório é da autoria do Departamento de
Contratualização dos CSP - ERA Norte mas é da responsabilidade do CD da ARS
Norte e do seu Presidente que o validou e publicou.
Presidente de uma ARS que tem como atividade principal
a Administração dos Cuidados de Saúde Primários, tendo um pouco mais de metade
deste sector entregue às USFs de Modelo B em que como mostra o relatório esta metade
não cumpre o estipulado no DL das USFs em prejuízo dos utentes e defraudando os
contribuintes; enquanto na outra quase metade os médicos estão, com o mesmo
número de utentes (2358 Unidades
Ponderadas), a trabalhar 40 hs e a ganhar metade e com acesso ao Modelo B
bloqueado. Presidente que se mostra satisfeito com esta situação e a nada se
propõe para a mudar e que publica com grande atraso este relatório em que não
só não cumpre o que está estipulado no
Despacho como em vez da requerida transparência optou pela opacidade e
pelo esconder.
Num país civilizado este Relatório implicaria a
imediata demissão do Presidente da ARS Norte.
3.10 Quando a Administração se
demite…
Apareceu finalmente publicado o Relatório
da ARSLVT sobre os horários das USFs modelo B. Largos meses depois dos 15
dias concedidos pelo Despacho 5803/2019
para ser publicado.
Nele consta:
Valor
dos incrementos aprovados pelos Conselhos Gerais das USF.
A análise dos
documentos recebidos dos Diretores Executivos permitiu determinar o valor do
incremento das UC, associado às UP da lista de utentes, em horas efetivas de
trabalho, que se resume no Quadro 32.
Os valores
dos incrementos constantes no Quadro 3 são valores médios de cada grupo
profissional: verificaram-se em algumas USF modelo B a aprovação de incremento
para parte do grupo profissional, havendo ainda outras USF em que somente um
profissional tem incremento.
Em média, o valor do incremento de cada UC
nas USF modelo B é de 14:30 minutos. A média do incremento dos grupos profissionais
médico, de enfermagem e de assistente técnico é de 18:28 minutos, 11:42 e 13:20
minutos, respetivamente.
Ou
seja, a mesma situação que se passa nas ASRs Norte e Centro e que analisei aqui e aqui.
Em
média cerca de 15 minutos de incremento de horário por cada Unidade de
Contratualização (suplemento com valor superior ao de uma hora suplementar), o
que no conjunto, pelas minhas contas, representa um pagamento anual de cerca de
50 milhões de Euros sem a devida contrapartida.
Uma
Administração que ao fim de 10 anos de Modelo B entrar em vigor, e mesmo depois
da alteração da Lei ocorrida em 2017 exatamente para o tornar explícito, ainda
não percebeu que as UCs de lista são o pagamento de horas suplementares e que
se cabe aos Conselhos Gerais aprovar os horários (horas de entrada e saída e
como se distribui o tempo pelas várias atividades), não lhes cabe determinar a
carga horária.
Administração que ainda não percebeu que nas
USFs de Modelo B, em que os Médicos auferem 9 UCs de lista, tem de dar parecer
negativo aos horários que lhe sejam subtidos com menos de 40 hs. Porque 40 hs é
a carga horária estabelecida para a carreira de Medicina Geral e Familiar para
quem tem listas a que correspondem 9 UCs.
Os
Relatórios das ARSs não só foram publicados vários meses após os 15 dias
previstos como apenas se debruçam sobre os incentivos e não cumprem uma das
partes a que o referido despacho obriga: A publicação dos horários de cada USF
no site da ARS.
O que
tem relevância pois a lei é clara em determinar que a autonomia dos Concelhos
Gerais para aprovarem horários tem que ser exercida dentro da lei. Acontece que
em varias USFs os Médicos têm horários com três tardes sem atividade
assistencial, o que não só é totalmente ilegal como sobretudo restringe a
acessibilidade dos utentes aos seu MF quando, nestas Unidades, devia acontecer
precisamente o contrário.
Pelo relatório ficámos a saber que apenas 8.6%
das USFs B têm o horário validado. Todas as outras chegaram ao fim de 2019 sem
terem os seus horários validados numa situação de total ilegalidade.
Validação do
Diretor Executivo:
o Compete ao
Diretor Executivo validar o valor do incremento e os horários de trabalho dos
profissionais das USF modelo B, com base na ata do Conselho Geral e da
fundamentação nela constante.
o A análise
das validações pelos Diretores Executivos permite obter diferentes resultados:
§ 8,6% das USF modelo B (6 USF) têm a
validação do Diretor Executivo no que respeita ao valor do incremento e aos horários de
trabalho de todos os profissionais;
§ 11,7% das USF modelo B (11 USF) o Diretor
Executivo não validou o valor do incremento e os horários de trabalho de todos
os profissionais;
§ 74,3% das USF modelo B (52 USF)
não têm a pronuncia do Diretor Executivo quanto à validação do valor do
incremento e aos horários de trabalho de todos os profissionais
Aquilo
que é novo neste relatório é o reconhecimento de que em 54 USFs do Modelo B
(74% das USFs de Modelo B da ARSLVT) os
Diretores Executivos dos respetivos ACES, se abstiveram de se pronunciar sobre
os horários que lhes foram submetidos. Nem validaram, nem deixaram de validar.
Calaram-se, demitiram-se de cumprir uma das suas funções mais básicas e
essenciais.
Compreendo
que os Diretores Executivos que até 2018 inclusive, aprovaram
irresponsavelmente horários de 35 horas que a esmagadora maioria lhes
apresentou (confiando aliás que essa era a indicação que a Administração
transmitia) não se sinta com moral para agora recusar esses mesmo horários sem
que nada na lei tenha mudado. O que mudou foi a tomada de consciência do erro
cometido e de como esse erro pode sobrar de forma pesada para cima deles. E por
isso optaram agora por não tomar
posição.
Isto
demonstra aquilo que eu escrevi aqui . Qua nossa Administração não se guia pela Lei mas
pelo interesse na boa imagem dos seus agentes junto dos subordinados sem a qual
sabem não poder sobreviver. E é esta lógica que leva a que este relatório, que
expõe totalmente o que se passa nas USFs em matéria de cargas horárias, omita
quais as USFs que têm os horários validados, quais as que têm os horários
chumbados, quais aquelas em que os Diretores Executivos optaram por não se
pronunciarem, de forma a não expor os Diretores Executivos.
Só que…
Pedi a
opinião de um amigo meu, Jurista altamente conceituado da nossa Administração
Pública, que na sua resposta, informal, não podia ter sido mais claro.
Meu caro,
A situação que me reportas é inconcebível.
Já não é só o Estado de Direito que, pelos vistos, passa ao largo do sector
da saúde, o que já de si é muito, mas mesmo muito grave.
Está também em causa a qualidade dos serviços prestados aos utentes, e, em
última instância, a credibilidade de todo o SNS. Está em causa a autoridade da
cadeia hierárquica.
É bom lembrar aos diretores executivos que as competências que a lei lhe
atribui são irrenunciáveis e são inalienáveis (cfr. o artigo 36.º do CPA).
Significa isto que não está na sua disponibilidade exercitarem-nas ou não,
ou exercer as das primeiras seis alíneas e deixar para melhor dias as das
últimas alíneas. Ou exercê-las às segundas, quartas e sextas, para as não
exercerem às terças e quintas. Não! As competências legalmente atribuídas são
corolários do princípio da legalidade e da função jurídico-pública em que esses
diretores foram investidos. A sua investidura, de resto, foi o resultado
de um acto da sua vontade. Ninguém é diretor executivo na sequência de uma
condenação transitada em julgado. Podes pois informá-los que a não aprovação
dos HT significa a violação de um dever legal e, longe de os isentar do que
quer que seja, responsabiliza-os bem fortemente e desde logo por grave omissão
e por todas as consequências que dela resultem.
António Alvim
3.11 Como ler o Modelo B na Lei das
USFs e os 5 erros da Administração na sua interpretação
Um dos problemas da Reforma dos Cuidados de Saúde
Primários, sobretudo em relação ao Modelo B, deriva de o Governo que o aprovou
nunca ter esclarecido como se interpreta a Lei das USFs no que a este se refere, nem dado qualquer formação nesta área aos
Diretores Executivos dos ACES onde existem Modelos B nem aos coordenadores das
Unidades de Saúde Familiar.
Em 2017 o governo alterou o DL das USFs para o
tornar mais preciso na questão das cargas horárias, depois de como lhe competia
ter apresentado aos parceiros sociais as propostas de alteração que não fizeram
objeção.
Os relatórios das ARSs Centro e Norte fazem a meu
ver um enquadramento legal errado e replicam uma série de erros instalados
relativos à interpretação do DL e que à frente irei explicar.
O despacho 5083 de 2019 21 06, foi uma
oportunidade perdida de esclarecer, mas apesar de na sua introdução se apontar
nesse sentido, na verdade limitou-se no seu articulado a referir-se aos aspetos
processuais, de quando e como se aprovam os horários, e o seguimento das atas
dos Conselhos Gerais das USFs com os horários. Aspetos que aliás deviam ter
sido esclarecidos há 10 anos.
Hoje vou dar e fundamentar aquela que é a minha
interpretação da lei nesta questão das cargas horárias no Modelo B. Se ela
tivesse sido seguida nunca o Modelo B alguma vez seria posto em causa, como o
está a ser neste momento, pois permitiria uma acessibilidade com um Tempo Médio
de Resposta Garantido de 5 dias úteis em vez das atuais 3 semanas que é igual
ao da mais humilde e desfalcada UCSP.
A meu ver
o Modelo B acabou e não haverá mais modelos Bs a não ser de uma forma
excecional. Digo isto suportado no fato de apesar de ter havido eleições em 6
de outubro e não ter aparecido nenhuma indicação de entrada em Modelo das 20
USFs com parecer técnico aprovado há mais de um ano; de o Ministérios das Finanças
não ter homologado essa passagem com fundamento de um estudo, não revelado, que
supostamente teria mostrado que as USFs de Modelo tinham deixado de ser custo
efetivas; e no Programa Eleitoral do Partido Socialista nunca se falar em
Modelo B mas sim na generalização do Modelo USF (Modelo A).
Lembra-se que o Ministro da Saúde Adalberto
Fernandes tinha por várias vezes garantido que o objetivo da legislatura que
terminou era o da criação de mais 100 USFs de Modelo B. Ficou-se por 42, muito
menos que as 72 alcançadas nos tempos difíceis do Governo de Passo Coelho, sob
a troika.
No início de tudo está o regime que vigorava em
2007: listas de 1550 utentes para uma carga horária de 35 horas. As listas
foram ponderadas e a uma lista tipo nacional . de 1550 utentes corresponderiam
1917 Unidades Ponderadas e daí que no Modelo B ficou como base 1917 UPs/35 hs.
E o governo para facilitar o aumento voluntário de listas e pagar em função
do tempo e trabalho necessários para dar resposta a esse aumento criou
as Unidades de Contratualização de lista (UCs).
Atribuindo, através de uma regra de três simples,
1 UC a cada aumento de 55 UPs. (1917 UPs/35= 54,77 UPs) e dando ao valor
de cada UC um valor correspondente ao de uma hora suplementar. Mais utentes,
mais trabalho, mais tempo necessário, pagamento de esse tempo suplementar. Este
foi o acordo feito com os sindicatos.
Uma nota interna da ERA de 2009 até dizia que no
Modelo B eram 1750 utentes 42 horas.
E a Nota da CNRSNS- CSPs de Agosto 2018
claramente confirma que cada UC corresponde ao pagamento de uma hora de
trabalho suplementar. E até tem um valor superior porque sendo o valor de 1
UC o de 1 hora suplementar no início da carreira, acontece que as 6
primeiras UCs são pagas com um fator de correção de 1,8 tornando-se assim o
valor da UC superior ao de uma hora suplementar.
A lei claramente distingue entre aquilo que
é pagamento de trabalho suplementar e aquilo que é compensação de
desempenho. As UCs devidas pelo aumento de lista estão na categoria de
suplemento, pagam tempo/atividade. Já as UCs resultantes das Atividades
Específicas são compensação por desempenho e não pagamento de tempo. Ou seja
desde o princípio que uma UC é claramente o pagamento de 1 hora suplementar de
trabalho, logo devem ser integradas na Carga Horária, porque se o não forem
fica-se numa situação em que os contribuintes estão a pagar algo que não é
feito e os utentes não gozam de um direito (melhor acessibilidade, mais tempo
de consulta, médico que o atende menos stressado) que lhes devia ser facultado
porque é pago para o ser.
Não é em vão que que, como disse acima, o
legislador fez questão de no nr.2 do novo artigo 23 nomear as UCs como
suplementos.
Artigo 28
Remuneração dos
médicos
1 - A remuneração
mensal dos médicos das USF integra uma remuneração base, suplementos e compensações pelo desempenho.
2 - A remuneração
base corresponde à remuneração da respetiva categoria e escalão, em regime de
trabalho de dedicação exclusiva e horário de trinta e cinco horas semanais,
relativa à responsabilidade pela prestação de cuidados de saúde aos utentes da
respetiva lista, com a dimensão mínima prevista no n.º 3 do artigo 9.º do
presente decreto-lei.
3 - São
considerados os seguintes suplementos:
a) O suplemento associado ao aumento das unidades
ponderadas, nos termos do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 9.º;
b) O suplemento da
realização de cuidados domiciliários;
c) O suplemento
associado às unidades contratualizadas do alargamento do período de
funcionamento ou cobertura assistencial, nos termos do disposto nas alíneas b)
e c) do n.º 5 do artigo 10.º, quando contratualizado.
4 - A compensação
pelo desempenho integra:
a) A compensação
associada ao desenvolvimento das atividades específicas, previsto no artigo
29.º;
b) A compensação
associada à carteira adicional de serviços, nos termos do disposto no n.º 6 do
artigo 6.º, quando contratualizada.
5 - As componentes
previstas nas alíneas a) e b) do n.º 3 do presente artigo são devidas e pagas
integral e mensalmente ao médico.
6 - As componentes previstas
na alínea c) do n.º 3 e na alínea a) do n.º 4, ambas do presente artigo, são
devidas ao grupo de médicos, divididas igualmente por todos, sendo paga,
mensalmente, a cada médico, a respetiva quota-parte.
7 - As componentes
previstas na alínea c) do n.º 3 e na alínea a) do n.º 4 são consideradas para
efeitos de aposentação ou reforma e para efeitos de abono de vencimento de
exercício perdido em virtude de faltas por doença ou de proteção social na
eventualidade doença.
8 - A remuneração
referida neste artigo implica o pagamento de subsídios de férias e de Natal nos
termos da lei.
Como as USFs não estavam a integrar as UCs de
Lista nas suas cargas horárias o Governo fez em 2017 uma correção da lei.
Artigo 23
2 - Nas USF modelo
B, o horário de trabalho deve ter como base as 35 horas com incrementos
ajustados às UC do suplemento associado às unidades ponderadas da lista de
utentes, previstas no artigo 30.º, 32.º e 34.º
Como se lê
a lei?
Uma vez que não tem qualquer ressalva a
leitura tem que ser literal. O aumento da carga horária tem que ser da mesma
dimensão das UCs pagas. Ou seja um profissional que recebe 9 UCs de lista terá
por lei que fazer 9 horas suplementares. Note-se que não será por acaso que
neste artigo se chama “suplemento” às UCs de lista.
Como
traduzir isto no horário?
Uma forma que me parece adequada ao que é o
trabalho de uma USF é para quem tem 9 UCs de lista aprovar um regime de 40 hs +
1 hora/dia em regime de isenção de horário, em 4 dias da semana.
Os 5 erros
de leitura da lei das USFs e da Administração
As auditorias feitas em 2018 terão revelado que
na maioria das USFs com 9 UCs de lista se praticavam horários totais de 35 hs. E
mesmo agora a ARS Centro Norte deu instruções para serem validados os horários
com ajustes mínimos das cargas horárias. E assim uma USF apresentou
incrementos de 2,5 m por UC viu sem reparo os horários aprovados.
O erro da ARS Norte está espelhado na nota
introdutória e que reflete também o pensamento dominante, mas como vou
demonstrar não tem base na lei.
No contexto do sistema remuneratório que compensa o esforço acrescido e
premeia desempenho, foi desenvolvido um modelo organizativo próprio, o modelo
B, mais exigente do ponto de vista de compromisso com a comunidade, no acesso, na qualidade, na satisfação
e no envolvimento, caracterizado por uma remuneração mensal com três
componentes: o básico, o relativo à compensação pelo esforço que gera um
acréscimo voluntário de número de utentes inscritos em lista e o relativo à
qualidade dos cuidados prestados.
O presente relatório pretende dar conta da forma
como as USF em modelo B, no exercício da
sua autonomia, determinaram o seu esforço, em tempo de trabalho, para dar
resposta ao aumento de utentes das respetivas listas e ao aumento proporcional
dos cuidados de saúde gerado pela ponderação das mesmas.
1º erro
Refere "o
relativo à compensação pelo esforço" - Seriam as UCs de lista.
Mas estas não são relativas a esforço. São na lei sempre referidas com
pagamento de suplementos, com o mesmo sentido de horas suplementares. Como
vimos acima pagam tempo, não esforço.
E, contrariamente
ao referido de maior exigência no acesso a verdade é que se manteve
para as USFs de Modelo B o mesmo TMRG de 3 semanas exigido a qualquer outro
tipo de unidade. E neste indicador até se aceita que apenas 60%
2º Erro
refere "dar
conta da forma como as USF em modelo B, no exercício da sua autonomia,
determinaram o seu esforço, em tempo de trabalho"
Tem subjacente a
ideia errada que as USFs trabalham por objetivos/resultados nos indicadores, e
que dispõem de total autonomia para se auto organizarem como quiserem e
autodeterminarem as suas cargas horárias e os seus horários tendo em vista o
atingimento desses objetivos.
Ora se é verdade
que as USFs gozam de autonomia organizativa, funcional e técnica
Artigo 3.º
4 - A atividade das USF desenvolve-se com autonomia organizativa, funcional e técnica,
integrada numa lógica de rede com outras unidades funcionais do centro de saúde
ou da unidade local de saúde.
Também é verdade
que esta autonomia é limitada pela Lei
Artigo 10.º
Organização e
funcionamento da USF
1 - A organização e
funcionamento da USF constam do seu regulamento interno e regem-se pelo
disposto no presente decreto-lei.
O 3º erro
é confundir
cargas horárias com horários e organização de horários. As USFs têm autonomia
para organizarem os horários, mas não para autodeterminarem as cargas horárias.
Estas estão na lei num artigo específico, que não é como vimos interpretável,
até porque correspondem ao pagamento de tempo que só pode ser pago se essa
contrapartida de tempo existir.
O 4º erro
é aceitar-se
que nas USFs B com 9 UCs se possa ter uma carga horária inferior a 40 horas.
Por duas razões: Porque o DL remete para o regime jurídico das respetivas
carreiras (logo a USF não tem autonomia para não respeitar isto), quando o
atual regime é o das 40 hs /2358 ups (as mesmas que conferem 9 ucs) e porque a
aceitar-se isto, como o aceitaram as ARSs do Centro e Norte (ainda se aguarda o
relatório da ARS-LVT- porque?), seria aceitar quebrar o princípio
constitucional trabalho igual salário igual. Pois estaríamos numa gritante
situação de para o mesmo trabalho no seguimento de lista de utentes idênticas
menos 5 horas trabalho e vencimento superior, no modelo B, do que os colegas
que estão em Modelo A ou em UCSP.
Artigo 21.º
Disposição geral
1 - O regime de prestação de trabalho é o previsto no regime jurídico
das respetivas carreiras profissionais, no regime jurídico do contrato
individual de trabalho e no presente decreto-lei, sem prejuízo das regras
adotadas por acordo expresso dos elementos da equipa multiprofissional nos
casos legalmente possíveis.
5º erro
é o esquecimento de
que na aprovação dos horários a autonomia está também limitada no DL pois este
condiciona ao seguimento das modalidades de regime de trabalho previstas na
Lei. E todas elas determinam dois períodos assistenciais por dia, um de manhã e
um de tarde. E este aspeto não tem sido verificado pelos diretores executivos,
que têm validados horários com 3 tardes livres a quem tem 9 UCs de
lista, nem foi avaliado nos relatórios da USF Centro e Norte.
Artigo 22.º
Prestação do trabalho
1 - A forma de prestação de trabalho dos elementos da equipa
multiprofissional consta do regulamento interno da USF e é estabelecida para
toda a equipa, tendo em conta o plano de ação, o período de funcionamento, a
cobertura assistencial e as modalidades de regime de trabalho previstas
na lei.
Nota- confia-se que
a nova Secretária Adjunta da Saúde, Jamila Madeira, com uma vertente mais
política e menos comprometida com os interesses corporativos consiga repor o
Modelo B nos trilhos e salvar o Modelo B para benefício da saúde dos utentes,
pois foi para isto que ele foi criado.
2A.5
Proposta para a revisão do Modelo B
Apesar
de ser um defensor do Modelo C, USFs privadas, preferencialmente dos seus
profissionais, convencionadas, o Modelo B, revisto, pode ser uma boa base para
a sua contratualização e por isso esta proposta para a sua revisão.
A Senhora Ministra da Saúde no encontro da USF AN (novembro
2019) veio-nos dizer que o Modelo B das UFSs era para continuar, e até que
todas as USFS do Modelo A que tivessem parecer técnico aprovado, no ano
seguinte à aprovação passariam para B, isto sem limitação por quotas.
Mas, e aqui um grande Mas, só haveria novos Modelos
Bs depois de revisto o modelo B. Revisão que teria que ser precedida, claro, de
negociação sindical. Ou seja, o Ministério da Saúde pode prolongar
indefinidamente a negociação, e usar isto, a não existência de novos modelos Bs
enquanto esta não termina, quer como arma de pressão sobre as estruturas
sindicais quer como forma de manter bloqueado o acesso ao Modelo B.
Assim, até para encurtar tempos, deixo aqui, da
minha inteira responsabilidade, uma reflexão e proposta para a revisão do
Modelo B.
Considerandos
2007
O Modelo B foi criado em 2007 quando na altura o
paradigma era as 35 horas -1550 utentes tipo.
Ou 42 horas com exclusividade -1550 utentes, mas 12 horas dedicadas a
serviços do tipo Serviço de Atendimento Permanente.
E foi da base as 35 h- 1550 utentes tipo (1917
Unidades Ponderadas) que se partiu. E, numa regra de três simples, se decidiu
pagar 1 hora suplementar por cada 55 Ups. O valor de uma UC é o valor de 1 hora
suplementar no primeiro escalão. Para estimular o aumento voluntário da lista,
e para compensar aqueles que estavam em escalões superiores cuja hora
suplementar teria um valor mais alto, ficou no DL que as primeiras 6 horas
teriam o seu valor corrigido por um fator de 1,8, de forma que em todos os
casos o valor de uma UC seria superior ao de 1 hora Suplementar.
Por outro lado, para captar para a Reforma os
médicos que na altura estavam na sua larga maioria em 42 horas com
exclusividade, foi concedido o subsídio da exclusividade, e com o bónus de a
ela não obrigar
Por outro lado, tem-se constatado que as horas
suplementares (UCs de Lista), que o DL, claramente específica como não sendo
incentivos ou prémio de desempenho, mas sim o pagamento de horas suplementares,
pagas porque supostamente seriam necessárias, não têm sido realizadas e na
grande generalidade os Conselhos Gerais das USFs têm aprovado horários de 35
horas ou pouco mais, apesar de todos estarem a receber 9 UCs de lista, conforme
claramente o demostraram as auditorias feitas em 2018 e os relatórios das ARS
Centro e Norte e ARSLVT de 2019
O relatório da ARS Norte reconhece isto tudo numa
frase: Os profissionais, embora tenham uma remuneração suplementar para
a gestão da lista de utentes, superior ao definido pelo preço de 1h extra,
propõem-se realizar, em média, ¼ dessa hora.
Os outros relatórios refletem esta mesma realidade e
o da ARSLVT revela que em 74% dos casos os Diretores Executivos se demitiram da
sua responsabilidade e se abstiveram de se pronunciar pelo que há mais de ano e
meio as USFs B estão na ilegalidade de não terem os horários provados,
O facto de a totalidade do horário poder ser
consagrado só à lista de utentes, ao contrário do regime em vigor em 2007, em
que 6 horas das 35 e 12 das 42 eram para serviços de atendimento tipo Serviço
de Atendimento Permanente e Atendimento Complementar, poderia ter permitido que
o Tempo Médio de Resposta Garantido fosse de 5 dias úteis e não o das 3 semanas
como o é nas UCSPs que, onde, além da lista, têm que atender utentes sem
médico.
Por outro lado, apesar da remuneração base ser a da
exclusividade, muitos médicos não estão em exclusividade (ao contrário do que o
próprio Correia de Campos afirma numa entrevista
em Setembro 2019 passado- “E porque as unidades de saúde familiar funcionam
com os médicos em dedicação exclusiva, porque têm incentivos financeiros ao
desempenho que permitem serem pagos de uma forma interessante.)
Assim a realidade é que os contribuintes em muitos
casos estão a pagar, de forma inútil, horas suplementares que não são feitas,
com o prejuízo de uma assistência que, se fossem cumpridas, poderia ser mais
atempada, e o bónus de exclusividades que não são cumpridas e até limitam a
disponibilidade desses médicos para a USF.
É este não cumprimento do suposto, mas mantendo a
remuneração respetiva, que torna iníquo o sistema quer para o contribuinte quer
entre profissionais em que tanto ganha o que cumpre como o que não cumpre, e
agrava a diferença remuneratória para quem não está em Modelo B, mas que para
uma mesma lista de utentes tem que cumprir 40 horas, ganhando metade. E que ainda por cima vê tapado o acesso ao
modelo B por este ser considerado excessivo pelas finanças, que o olham com uma
desconfiança que as decisões dos Conselhos Gerais da maioria das USFs
justifica.
O Modelo B, e a sua generosa remuneração paga pelos
contribuintes, só encontra justificação se for uma oportunidade de se fazer
mais e os utentes terem mais. Nunca pode ser o contrário.
2020
Ora hoje, desde 2012, o paradigma é o das 40 Horas-
1900 utentes tipo (2356 Unidades Ponderadas-UPs). 2356 UPs que correspondem exatamente a 9
Unidades de Contratualização-UCs no atual modelo B.
Pelo que fará sentido passar a ser esta a base para
os novos modelos Bs e para os profissionais que entrarem para os Modelos Bs já existentes,
até porque será esse já o regime predominante de quem está no Modelo A e porque,
em face das muitas aposentações que irão ocorrer, se manterá um número elevado
de utentes sem Médico de Família
Deve ainda ser concedido o subsídio de exclusividade
(+39,8%) para estimular a dedicação plena, mas só a quem a praticar. E o Tempo Médio de Resposta Garantida- TMRG, deverá passar a
ser de 5 dias úteis, sendo que o valor a pagar nas Atividades Especificas
deverá ser condicionado pelo cumprimento deste TMRG.
Quanto aos que já estão em Modelo B, as alterações
que parecem fazer sentido serão as seguintes:
- Só será pago o número de UCs correspondentes às
horas acima de 35 horas que constem nos horários aprovados pelo Conselho Geral,
sendo, contudo, considerada a possibilidade para quem tem 9 UCs de Lista, o
horário ser de 40 horas mais 1 hora por dia em regime de isenção de horário (o
que resolve a queixa de muitos que dizem que trabalham para além da hora sem se
aperceberem que afinal recebem mais horas do que as que fazem).
- O regime base só será o da exclusividade para quem
de facto a praticar, senão será o das 35 horas simples.
- O TMRG deverá passar a ser de 5 dias úteis, sendo
que o valor pagar nas Atividades Especificas deverá ser condicionado pelo
cumprimento deste TMRG.
Nota: Para os novos modelos Bs embora faça sentido o
que se escreveu acima, até porque essa é, no Modelo A de onde veiem, a
realidade atual, nada contra em que fiquem no regime proposto para os que já
estão em B
Atividades
Específicas
Aqui eu seria conservador, e evitaria o risco de
entrar em indicadores de difícil monotorização e sujeitos à lei dos pequenos
números, tais como “taxa de internamentos evitáveis”
Mas baixaria em alguma coisa o alvo das Hemoglobinas
A1 C, e, tendo os indicadores financeiros dos Enfermeiros passado a ter na base
da sua atribuição as Atividades Específicas, faz sentido que onde está nos
“programas” consulta médica, passe a estar: “consulta, no mesmo dia, com o MF e
o Enfermeiro de Família”, para estimular e demostrar que existe trabalho de
equipa de saúde.
Horários
Só devem ser validados horários minimamente conforme
a Lei e que demonstrem estarem construídos em função dos interesses dos
utentes. Assim devem estar distribuídos
pelos cinco dias da semana, sendo que pelo menos em 4 dias da semana devem ter
um período assistencial de manhã e de tarde, com um mínimo de duas horas cada.
E, se me permitem ir um pouco mais além, em todo o
período de funcionamento da USF devem estar sempre presentes metade dos
profissionais (arredondando para baixo se o número for ímpar). Excetuando
talvez a primeira e última hora, a hora de almoço e as três últimas horas do
dia. Em todas as circunstâncias devem
estar sempre presentes pelo menos dois profissionais de cada categoria profissional.
Suspensão
da Remuneração do Modelo B
Os horários deverão ser aprovados pelo CG da USF no
último trimestre do ano anterior e validados pelo Diretor Executivo que terá
quinze dias para o fazer, até 31 de dezembro. Os Diretores Executivos dos ACES
só poderão validar horários que cumpram o estipulado acima, quer na carga
horária quer na sua distribuição. Será tudo o que se lhes pede que avaliem.
Todo o resto, sim, compete à autonomia e Concelho Geral da USF.
A remuneração do Modelo B será automaticamente
suspensa se a USF não tiver os horários validados (quer por despacho contrário
quer por omissão do mesmo) e será paga a remuneração das 35 horas simples das
várias carreiras profissionais. Só será retomada, sem retroativo, no mês
seguinte à sua revalidação.
No ano em que estas alterações entrem em vigor as
USF e o Diretor Executivo do ACES deverão ter os novos horários aprovados e
validados no prazo de um mês após a entrada em vigor.
Conclusão
Estas são as retificações que eu promoveria. As
quais por um lado, permitem, a quem se dispusesse a cumprir o suposto, manter
na totalidade aquela que é uma remuneração excecional no panorama remuneratório
da nossa função pública, e por outro acabar com as desconfianças e suspeições
das Finanças. A consagração de um TMRG de 5 dias úteis tornaria irrecusável a
generalização do Modelo B. Para bem dos
utentes e dos profissionais.
Aproveitemos a oportunidade.
Ps1 - Na minha USF, enquanto fui coordenador (2000-2009)
como RRE e início do Modelo B, sempre se praticou um TMRG de 5 dias úteis até
que passamos a Modelo B e os médicos aumentaram as suas listas para as 2356 UPs,
mas sem aumentarem a carga horária. O TMRG passou para 3 semanas e eu deixei de
ser coordenador. O meu TMRG continua a ser o de 5 úteis. Escrevo isto para
demonstrar que um TMRG de 5 dias uteis é possível.
Ps2- E convém lembrar que no Modelo B os Médicos de
Família atingem a mais alta remuneração da Função Pública, superior à do
Primeiro Ministro incluindo nesta as despesas de representação. Sem o stress de
um banco de urgência hospitalar, sem noites, sem fins de semana e com um
horário regular. Cabe-nos compreender isto e decidir se a queremos manter.
PS3. Tal como um diabético não resiste se lhe
puserem um prato de bolachas à frente a experiência do Modelo USF assente num
Conselho Geral onde todos têm um voto demostrou em como uma USF assente no
interesse dos utentes rapidamente vira numa USF assente no interesse dos
profissionais (basta alguém dizer algo como” é o que os outros fazem”, “é o que
dizem os sindicatos”, “o ACES validou…”). Por isso é necessária uma limitação
externa. Tirar da mesa o prato das bolachas. O qual verdadeiramente nunca
esteve na mesa. Foi apenas uma ilusão resultante da
irresponsabilidade, captura e demissão de toda a Administração.
*******************************************************
Nota: Passado mais de um ano não se conhece qualquer proposta do Ministério da Saúde para a revisão do Modelo B. Tudo continua na mesma. Só o despacho que todos os anos é publicado por lei em Janeiro, com o número de novas USFs e novos modelos Bs , este ano ainda não apareceu.
E o no programa de Governo desta legislatura fala na generalização do Modelo USF mas não fala em Modelo B
E sem o Modelo B desaparece o incentivo que alimentou a reforma de 2006
Vamos assistir a uma regressão e os novos Médicos de Familia preferirão opções fora do SNS agravando o problema dos Sem Médico. Isto Já foi evidente no concurso de outubro 2020 em que 30% preferiram ficar de fora